Seguidores

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Joaquim Pessoa ///

Necessito de mim mais do que de ninguém. Mas mentiria se
não confessasse o quanto preciso de ti

 

Dia 225.

Necessito de mim mais do que de ninguém. Mas mentiria se
não confessasse o quanto preciso de ti. Tu és o meu vinho e
a minha ressaca. A minha árvore e a minha floresta. O meu
cavalo. A minha casa, o meu mar, o meu coral. A minha tei-
mosia e a minha lucidez. O meu pássaro de chuva e o meu
pássaro de fogo. A minha distância, o meu abismo, a minha
fuga. A minha sombra e o meu túnel. O atalho para o outro
lado de mim.
Tu és a minha estrela e o meu guia. A minha porta, o meu
clarão, a minha injúria. O meu grão, o meu vento, o meu
moinho. O meu sortilégio. O fim da festa e o meio-dia.
O meu carnaval, o meu brinquedo, o meu dia santo. O meu
pecado, a minha penitência. O ouro, a ofensa, o desvario. És
o meu hábito e o meu monge. A minha espiga e o meu pão.
A minha irmã branca, a minha irmã negra, a minha irmã de
novas latitudes. A minha amante e a minha mãe, o meu abra-
ço e as minhas margens. A minha prostituta, o meu combate,
o meu sorriso. Tu és o meu cálice. O meu elixir e o meu ve-
neno. O vinho que dá coragem às medusas.
Necessito de ti mais do que de ninguém. Mas mentiria se
não te confessasse o quanto preciso de mim.

*
Joaquim Pessoa
in ANO COMUM

Sem comentários: