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quinta-feira, 30 de abril de 2015

Antónia Pozzi ///// Leve oferta


MAIS UM.......

Queria que a minha alma te fosse
ligeira
como as últimas folhas
dos choupos, que se incendeiam ao sol
sobre os ramos envoltos
de névoa –
Queria guiar-te com as minhas palavras
por uma alameda deserta, semeada
de ténues sombras –
até um vale de silêncio coberto de erva,
até ao lago –
onde vibra a cada sopro de ar
o canavial
e as libélulas brincam
em águas profundas –
Queria que a minha alma te fosse
ligeira,
que a minha poesia te fosse uma ponte,
subtil e segura,
branca –
sobre a escura voragem
da terra.

Antónia Pozzi, "Morte de uma estação" (tradução de Inês Dias)
Leopoldo Pomés


quarta-feira, 29 de abril de 2015

Nuno Judíce //// Fonte


As confidências demoram-se no céu da boca
como as nuvens lentas do Outono. Sopro-as,
para que o céu se limpe e apenas uma névoa vaga
se cole ao que me queres dizer; mas
encostas-me os lábios ao ouvido e tu, sim,
é que me contas que céu é este, e de onde
vêm as nuvens que o cobrem. Sentimentos,
emoções, paixões, interpõem-se entre
cada frase. Nem há outros assuntos
quando nos encontramos, e me começas a falar,
como se fosse o coração a única
fonte do que dizemos.

Nuno Júdice 

Resultado de imagem para foto labios no ouvido

terça-feira, 28 de abril de 2015

Enrico Macias ♥♫TANGO L'amour c'est pour rien

https://youtu.be/rLUuqe7d1tQ



CLIQUE NO LINK


Tango sensual elegante , bela demonstração  em toda a sua expressão...

PARA VER EM TELA CHEIA


Laura Santos ///// Como se.....

Como se...

 O firmamento parava nos meus olhos para te olhar. Como se a Primavera tivesse trazido as cores de todas as flores imperecíveis e os desígnios insondáveis do mundo e arredores. Dizias frases supostamente com sentido, e tomavas no teu o meu corpo como se não existisse a hora seguinte, e o amanhã pudesse ser remoto e adiável.
 Inventei em ti a frescura das manhãs e o mistério do movimento de translação da terra, a ondulação das giestas, os gestos quentes e atlânticos feitos de azul e mar. A certeza ilusória de um trilho em direcção ao sol poente, como anjo de asas cortadas que se tivesse esquecido de descobrir a claridade dos dias, mas se aventurasse na penumbra da noite.
 Reconheci o teu respirar no meu, sempre que a lua se sentava distraidamente no meu peito quando adormecias e me encostava a ti, e  existia uma leve brisa feita de ternura que despertava em deslumbramento todos os silêncios. Uma brisa feita de oceanos de palavras não ditas, amarrotadas nos bolsos, e da opulência de mãos acesas que davam luz aos corpos e incendiavam a matéria. Pendurei no teu corpo o infinito, como se um momento tivesse em si a semente robusta de um dia claro e abrangente. Como se tudo existisse em ti...
 Suaves gotas de chuva tépida molham o regresso dos dias. Descubro-te ainda em cada arco-íris, como se fosses o sol que me ilumina aonde quer que vá. Como se um brado sereno travasse os movimentos antes incontidos das marés, e todos os rios só encontrassem agora o caminho para o orvalho do meu olhar. Todo o sentimento de ausência pode ser um longuíssimo adágio ou uma sinfonia descontínua de sons e imagens difusas que estremecem no ruído dos dias. Ou tímidos vazios imperiais de desalento. Lá fora a manhã vagarosamente se anuncia. Restos de noite sobem de mão dada com a densa neblina enquanto o meu corpo, mera superfície lavrada, desperta a lembrança do Verão fazendo soprar um bafo quente de tempo irrepetível.
 Continuas a caminhar nos meus passos com a leveza das aves anónimas que há muito voaram para longe, aladas na ventania que deixa para trás árvores decapitadas. Galopo contudo a crista da manhã como se me esquecesse de ser triste, e a tranquilidade da noite tivesse emprestado ao dia uma doce e serena resignação.

Laura Santos  


Uma animação de Louis Clichy  para a canção "À quoi ça sert l'amour?" comTheo Sarapo e Edith Piaf.

CLIQUE NO ENDEREÇO :
https://youtu.be/DAQBiqomiNo

segunda-feira, 27 de abril de 2015

Rafael Humberto Lizarazo //// Retrato

Retrato
Escreverei um poema
de amor
que fale de ti
em duas
ou três linhas
recordarei
o instante em que
te conheci
O canto de um pardal
- distante-
Me trará a brisa,
então
entre estrofes
redondilhas
capturarei
teu riso.
Pintarei de memória
teu corpo,
teus cabelos
olhando
as estrelas
desenharei também
teus belos
olhos.
Estarás em meus versos
prisioneira,
terei debaixo
da minha almofada
o teu perfume
de primavera.


Rafael Humberto Lizarazo   


Singin' In The Rain (do filme Serenata à Chuva)

https://youtu.be/0S_-s4vJxMU 


Clique no endereço






........................"Serenata à Chuva", realizado pela célebre

dupla Gene Kelly e Stanley Donnen, em 1952, tem sido e

será sempre considerado como um dos mais completos,

perfeitos e deslumbrantes musicais da História do Cinema. 

Do seu irresistível romantismo à sua evocação nostálgica


passando pelo seu delirante sentido de comédia e sátira

"Serenata á Chuva" é uma obra-prima a vários títulos, desde

 logo marcada pelo fabuloso elenco reunido por Kelly e

Donen: Debbie Reynolds, Donald O'Connor, Cyd Charisse,

Jean Hagen e Rita Moreno, entre outros.

Laura Santos /// Pele

Pele

                                        

Tudo acorda em mim enevoado
quando em mim te afundas e te deitas.
Um torpor, um arrepio na espinha
quando nas minhas coxas te ajeitas
em leve murmúrio abafado
numa vontade que já não é minha.
Seiva, saliva, humidade de poros,
vaga de lume batida em corpo salgado
tropicais cascatas e meteoros
oscilando em revolta navegação
como calado de barco afogado
fogo liberto em silêncio de amarração.
A minha pele adormecida
 é avida de astrolábios desconcertados
de tanta sede acometida.
De gestos de ternura perfumados
de sol, chuva e frescas nuvens
de mastros de coragem levantados.
Mas tu hoje não vens.


Laura Santos 

Nu Sentado, Picasso   








domingo, 26 de abril de 2015

Miguel Torga //// Recomeça....


Se puderes,
Sem angústia e sem pressa.
E os passos que deres,
Nesse caminho duro
Do futuro,
Dá-os em liberdade.
Enquanto não alcances
Não descanses.
De nenhum fruto queiras só
metade.
E, nunca saciado,
Vai colhendo
Ilusões sucessivas no pomar
E vendo
Acordado,
O logro da aventura.
És homem, não te esqueças!
Só é tua a loucura
Onde, com lucidez, te reconheças

Miguel Torga   



sábado, 25 de abril de 2015

Maria José Reis //// Penso em ti


PENSO EM TI !!

Na margem deste vento penso em ti

Nas palavras que me disseste em tempo,

Quanto eu dera para te ter aqui

Meu triste pensar, meu triste lamento !...
 
Quero de ti muito amor e amizade

Não quero mais viver mágoa e dor,

Só harmonia e a tua verdade
,
Quero um mundo bendito todo em flor...
 
Desejo em ti deixar-me adormecer

E viajar ao mundo da poesia

Onde vivo o fascínio do crescer...
 
Na energia do teu doce olhar

Vejo complacência e simpatia,

É o sol, o céu, minh'alma a cantar !

Maria José Reis 







sexta-feira, 24 de abril de 2015

Laura Santos //// Sinto a tua falta

Sinto a tua falta

                                                                  
 

                                        Sinto a tua falta
                                        quando
                                        no mofo dos dias
                                        os braços da aurora me acordam
                                        e do peito uma ave se solta em voo de luz
                                        em direcção à nora
                                        onde os meus olhos bebem a manhã
                                        na névoa do velho alcatruz.
                                        Quando
                                         os raios do meio-dia escorrem
                                         pelas paredes num lamento
                                         e o calor refugiado na sombra
                                         não me refresca o pensamento
                                         na hora dorida que se arrasta
                                         sem vontade de morrer na lonjura
                                         que de ti me afasta.
                                         E é vertical a tua lembrança
                                         caindo a prumo. Transportando
                                         para as masmorras da esperança
                                         a escuridão da noite e a voz
                                         que permanece muda
                                         no atalho da distância.
                                         O brilho das coisas raras esconde-se
                                         na seiva dos lírios e num desejo
                                         feito cobiça de águas invioladas
                                         onde se atrevem temerários sonhos;
                                         os últimos sobreviventes
                                         do amor e da morte. Reféns
                                         suspensos de grandes asas
                                         que se despenham fazendo estremecer
                                         os alicerces dos homens e das casas.
                                         Apanho-os do chão, labareda feita água
                                         na plenitude do nada, dura solidez
                                         em que me sinto e me distraio
                             
                                         quando
                                         atravesso o rio e os meus passos
                                         lentamente marginais
                                         não alcançam como dantes
                                         os desígnios dos espaços siderais
                                         e uma nota em dó menor
                                         atormenta o sono das pedras.
                                        Quando
                                         ao cair da tarde uma folha seca
                                         soa em corrupio no vento
                                         e desaparece sem o regresso
                                         do sol ao firmamento.
 
Laura Santos 





CLIQUE NO ENDEREÇO :

Jacques Brel - Ne Me Quitte Pas


https://youtu.be/i2wmKcBm4Ik

quinta-feira, 23 de abril de 2015

Florbela Espanca //// Alma perdida

Alma Perdida


Toda esta noite o rouxinol chorou,
Gemeu, rezou, gritou perdidamente!
Alma de rouxinol, alma de gente,
Tu és, talvez, alguém que se finou!

Tu és, talvez, um sonho que passou,
Que se fundiu na Dor, suavemente...
Talvez sejas a alma, alma doente
D'alguém que quis amar e nunca amou!

Toda a noite choraste ... e eu chorei
Talvez porque, ao ouvir-te, adivinhei
Que ninguém é mais triste do que nós!

Contaste tanta coisa à noite calma,
Que eu pensei que tu eras a minh'alma
Que chorasse perdida em tua voz!...


Florbela Espanca
    in Livro de Mágoas 
 
 
 

Nuno Júdice //// Podíamos....

Podíamos...
Podíamos saber um pouco mais
da morte. Mas não seria isso que nos faria
ter vontade de morrer mais
depressa.
Podíamos saber um pouco mais
da vida. Talvez não precisássemos de viver
tanto, quando só o que é preciso é saber
que temos de viver.
Podíamos saber um pouco mais
do amor. Mas não seria isso que nos faria deixar
de amar ao saber exactamente o que é o amor, ou
amar mais ainda ao descobrir que, mesmo assim, nada
sabemos do amor.

Nuno Júdice  

 




quarta-feira, 22 de abril de 2015

Laura Santos //// A pomba


      A pomba                    



                   Sonhei que o teu corpo era um riacho.
                                              Nas tuas margens plantei todas as sementes;
                                              De ti tudo nasceu, tudo transformaste:
                                              O que sonhei, o que sonhaste.
                                              Do sol veio a luz,
                                              No teu corpo lavrado floresci.
                                              Depois nem sei, vi que mudaste.
                                              Já não eras riacho, eras fonte seca
                                              Onde mirei o meu olhar.
                                              Do teu corpo nu brotou a árvore,
                                              Dos teus cabelos revoltos, como folhas, o silêncio
                                              As minhas mãos poisaram como pássaros
                                              Nas tuas mãos abertas como pontes.
                                              Tua boca debiquei e tu sorriste.
                                              Do nada surgiu o teu peito branco,
                                              Nas tuas costas graníticas me sentei.
                                              Debrucei-me sobre ti, uma nuvem surgiu;
                                              Do céu dos teus olhos, como grãos
                                              Gotas caíram.
                                              Sequiosa pomba mensageira, uma bebi.
                                              Passei teu território, a fronteira.
                                              Voltei de novo a ti mas não te vi.
                                              Diz-me meu amor porque voaste...
 
 
Laura Santos   




terça-feira, 21 de abril de 2015

Mia Couto //// Solidão


Aproximo-me da noite
o silêncio abre os seus panos escuros
e as coisas escorrem
por óleo frio e espesso
Esta deveria ser a hora
em que me recolheria
como um poente
no bater do teu peito
mas a solidão
entra pelos meus vidros
e nas suas enlutadas mãos
solto o meu delírio
É então que surges
com teus passos de menina
os teus sonhos arrumados
como duas tranças nas tuas costas
guiando-me por corredores infinitos
e regressando aos espelhos
onde a vida te encarou
Mas os ruídos da noite
trazem a sua esponja silenciosa
e sem luz e sem tinta
o meu sonho resigna
Longe
os homens afundam-se
com o caju que fermenta
e a onda da madrugada
demora-se de encontro
às rochas do tempo

Mia Couto, in "Raiz de Orvalho e Outros Poemas"








Alfredo Costa Pereira //// A nossa partitura....

 
Mais um ......
 

O búzio encantado entoava
Aquela maravilhosa sinfonia,
Misto de amor e harmonia
Que criamos, e ressoava;
Aquele búzio sempre repetia
Durante a tarde a tal melodia;
Era escutada por uma gaivota
Que se desviava da sua rota!
O Tempo guardou a partitura
Nunca destruiu nosso compor
Mas seria o Tempo ou tu, amor?
Meus olhos cheios de ternura
Deram à minha alma euforia
Ventura e mundos de alegria!
 

Alfredo Costa Pereira  

Foto de Alfredo Costa Pereira.

segunda-feira, 20 de abril de 2015

Célia Meira //// Quero.....

Quero os segundos e os dias
e quero as noites e as sombras
e quero as tuas paredes e as ruínas
e quero o fogo dos teus olhos
e quero a fome das tuas mãos
e quero o azul do teu céu
e o sol que te aquece
e as lágrimas que te escorrem
e a solidão que te esconde
e quero o instinto do teu corpo
e a expiação do teu chão
e os rios que em ti nascem
e a cepa do teu vinho
e quero as ondas do teu cabelo
e quero as paixões desmedidas
e a seiva das tuas feridas
e quero fugir para a tua ilha
e quero as maças do teu rosto
e quero o sorriso da tua boca
e quero o beijo que me despe.

Autora: Célia Meira 


domingo, 19 de abril de 2015

LÍLIA TAVARES ///// O meu olhar de tanto mar



O meu olhar de tanto mar
fixou-se numa nuvem de vento.
Dispo-me de gaivotas
quando é o teu olhar com asas
que me solta e agarra,
pois dois sentidos moram
para além de nós,
nos habitam e esperam
sentados aos tropeções
dentro dos nossos corpos.
São aves de muitas ondas,
as que nos beijam.
A hora chegou com o seu gume.
Amor,
volto a partir com os ventos....
 

LÍLIA TAVARES

 in PARTO COM OS VENTOS



VENTOS 





sábado, 18 de abril de 2015

são reis


às vezes perguntam-me o que tenho
de onde vem essa vontade de expor a alma
de dar vida às palavras
de me virar do avesso
de ser o que nunca fui
nem aprendi a ser
Poderia responder-lhes que me procuro
que me busco mais além
um degrau mais acima
que amo os peixes mas nunca serei um
que mergulho no mar com a necessidade
de quem se purifica
e que subo à montanha mais alta para gritar
que anseio pelos teus braços
e volteio na cova da minha ansiedade
que sou espuma e vento
ar e sustento
de quem nada tem
Mas fora isso, sou a mesma
por dentro e por fora
e isso nunca será diferente
viva eu as vidas que viver
dentro ou fora de ti

são reis 
 
 

sexta-feira, 17 de abril de 2015

Casimiro de Abreu //// Borboleta

Borboleta

Borboleta dos amores,
Como a outra sobre as flores,
Porque és volúvel assim?
Porque deixas, caprichosa,
Porque deixas tu a rosa
E vais beijar o jasmim?
Pois essa alma é tão sedenta
Que um só amor não contenta
E louca quer variar?
Se já tens amores belos,
P'ra que vais dar teus desvelos
Aos goivos da beira-mar?
Não sabes que a flor traída
Na débil haste pendida
Em breve murcha será?
Que de ciúmes fenece
E nunca mais estremece
Aos beijos que a brisa dá?...
Borboleta dos amores,
Como a outra sobre as flores,
Porque és volúvel assim?
Porque deixas, caprichosa,
Porque deixas tu a rosa
E vais beijar o jasmim?!
Tu vês a flor da campina,
E bela e terna e divina,
Tu dás-lhe o que essa alma tem;
Depois, passado o delírio,
Esqueces o pobre lírio
Em troca duma cecém!
Mas tu não sabes, louquinha,
Que a flor que pobre definha
Merece mais compaixão?
Que a desgraçada precisa,
Como do sopro da brisa,
Os ais do teu coração?
Borboleta dos amores,
Como a outra sobre as flores,
Porque és volúvel assim?
Porque deixas, caprichosa,
Porque deixas tu a rosa
E vais beijar o jasmim?
Se a borboleta dourada
Esquece a rosa encarnada
Em troca duma outra flor;
Ela - a triste, molemente
Pendida sobre a corrente,
Falece à míngua d'amor.
Tu também minha inconstante
Tens tido mais dum amante
E nunca amaste a um só!
Eles morrem de saudade,
Mas tu na variedade
Vais vivendo e não tens dó!
Ai! és muito caprichosa!
Sem pena deixas a rosa
E vais beijar outras flores;
Esqueces os que te amam...
Por isso todos te chamam:
- Borboleta dos amores!


Casimiro de Abreu  



Laura Santos /// Passado

PASSADO

                                                   Nos montes deixei a tua imagem
                                                   gravada na pedra do passado.
                                                   Parti em longa viagem, à espera  da janela
                                                   do significado.Cada significante surgia
                                                   no cume da palavra, em cada dia
                                                   na tua voz de linho. Tanta a saudade
                                                   do que não fiz, tantas as pedras no caminho.
                                                   
                                                    Na coragem da ternura sopra o vento
                                                    que faz desabrochar um rio
                                                    no meu cabelo...Vem despentear-me,
                                                    vem dizer que sim.
                                                    Vem deitar-te enfim, como água
                                                    sobre mim.


Laura Santos 





quinta-feira, 16 de abril de 2015

Cecília Meireles ///// Desejo.....


Por mim, e por vós, e por mais aquilo
que está onde as outras coisas nunca estão,
deixo o mar bravo e o céu tranquilo:
quero solidão.
Meu caminho é sem marcos nem paisagens.
E como o conheces? - me perguntarão.
- Por não ter palavras, por não ter imagens.
Nenhum inimigo e nenhum irmão.
Que procuras? Tudo. Que desejas? - Nada.
Viajo sozinha com o meu coração.
Não ando perdida, mas desencontrada.
Levo o meu rumo na minha mão.
A memória voou da minha fronte.
Voou meu amor, minha imaginação...
Talvez eu morra antes do horizonte.
Memória, amor e o resto onde estarão?
Deixo aqui meu corpo, entre o sol e a terra.
(Beijo-te, corpo meu, todo desilusão!
Estandarte triste de uma estranha guerra...)
Quero solidão.

Cecília Meireles 



quarta-feira, 15 de abril de 2015

SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN



Serenamente sem tocar nos ecos 
Ergue a tua voz
E conduz cada palavra
Pelo estreito caminho.

Vive com a memória exacta
De todos os desastres
Aos deuses não perdoes os naufrágios
Nem a divisão cruel dos teus membros.

No dia puro procura um rosto puro
Um rosto voluntário que apesar
Do tempo dos suplícios e dos nojos
Enfrente a imagem límpida do mar.



SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN, in OBRA POÉTICA 


RETOÑO MIO ( Snatam Kaur ) Esta Es La Bendición De Tu Madre


CLIQUE NO ENDEREÇO :

https://youtu.be/0Q1sibCpdxA
 
 
Foto de Hamilton Ramos Afonso -poesia.

Ana Maria //// Plenitude

 
Procuro-te nos passos que dou pela praia imensa
Para lá das ondas que me agitam a alma
Nas lágrimas teimosas que do meu fogo caem
Na tarde serena de chuva calma

Procuro-te no misterioso nevoeiro cerrado
Na espuma branca da água salgada
Na agitação das vagas que me alagam os pés
Na torrente de desejo desenfreada

Procuro-te por entre os meus dedos
Na fortaleza singela do meu abraço em segredo
Em cada interstício do meu corpo
No tormento atroz do meu inevitável degredo

Procuro-te insaciável nas estrelas
Na lua hipnótica que me fascina desgovernada
Na tempestade que inunda os caminhos
No palco de vida frenética inventada

Procuro-te em aconchego no meu seio
E morrerei com um grito sufocado na boca cerrada
Estigmatizada pela escrita transfigurada vicissitude

Procuro-te mas não te encontro!
Num campo verde confiança em quietude
Num céu de nuvens brancas de pureza
Minha irmã apartada beatitude

Procuro-te mas não te sinto!
Amiga companheira e glacial plenitude!


Ana Maria   


terça-feira, 14 de abril de 2015

Luadiurna /// Há............

Há palavras costuradas dentro do coração
com finíssimos fios de seda
é lá que se guardam os sentimentos que na alma
afloram repartidos na verdade do sentir
Há palavras que se (res)guardam por serem direitas e limpas
como direitos e limpos são os caminhos percorridos
são palavras ao rubro que escorrem pelos dedos da noite
onde o toque das estrelas ilumina o universo de quem espera
p`la manhã radiosa onde o sol é o abraço que aquece e reconforta
é o teu sorriso que aquece os dias vulgares
e é o teu nome escrito no horizonte.

LUADIURNA 




Que amor não me engana Com a sua brandura Se da antiga chama Mal vive a amargura Duma mancha negra Duma pedra fria Que amor não se entrega Na noite vazia? E ...


Clique no endereço :
https://youtu.be/HoQPQfAjr6M

segunda-feira, 13 de abril de 2015

Natália Correia //// O espírito

O espírito

Nada a fazer amor, eu sou do bando
Impermanente das aves friorentas;
E nos galhos dos anos desbotando
Já as folhas me ofuscam macilentas;
E vou com as andorinhas. Até quando?
À vida breve não perguntes: cruentas
Rugas me humilham. Não mais em estilo brando
Ave estroina serei em mãos sedentas.
Pensa-me eterna que o eterno gera
Quem na amada o conjura. Além, mais alto,
Em ileso beiral, aí espera:
Andorinha indemne ao sobressalto
Do tempo, núncia de perene primavera.
Confia. Eu sou romântica. Não falto.


Natália Correia   


domingo, 12 de abril de 2015

Rui Amaral Mendes Ausência


hoje
quais primeiras folhas que
se entregam ao húmus da terra
num outono a dealbar
no ciclo das estações que de-compõem a minha existência
fios salgados de um
pequeno rio que nasce no meu âmago
escorrem pelo meu rosto
imolando-se no fogo
de vastos campos de afectos
por ceifar
vivo manhã num tempo novo
depois do equinócio
em que o movimento celeste
lentamente distancia a luz
do meu ser
conduzindo a novos compassos
onde predominará
a escuridão
em que vivo a ausência de ti

Rui Amaral Mendes [na luz do crepúsculo]



sábado, 11 de abril de 2015

Nuno Júdice

Parte: como se tivesses de ser esquecida,
deixando atrás uma imagem de sombra. Não
leves contigo as palavras que trocámos,
como cartas, num instante de despedida; mas
não te esqueças da luz da tarde que os teus
olhos abrigaram. Por vezes, lembrar-me-ei
de ti. É como se, ao voltar-me, ainda me
esperasses, sem um sorriso, para me dizeres
que o tempo tudo resolve. Não te ouço; e,
ao aproximar-me dos teus braços, vejo-te
desaparecer. Mais tarde, penso, isto fará
parte de um poema; mas tu insistes. O amor
chama-nos, de dentro da vida; obriga-nos a
renunciar à imobilidade da alma, a sacri-
ficar o corpo a um desejo de memória.
 
 

Nuno Júdice






sexta-feira, 10 de abril de 2015

LUÍS FILIPE MAÇARICO //// Árvore

 
Quero entrar na flor dos
Teus lábios
de cerejeira,
Dançar na carícia amena
Do teu sangue
Arder entre glicínias
e laranjais,
Na brisa quente
do corpo de erva
e barro.
Ser tu e eu
No verso de água
dos gestos em comunhão.
Ficar enfim no teu olhar
Como quem se transforma
em árvore
Depois da longa caminhada.



LUÍS FILIPE MAÇARICO





  



quarta-feira, 8 de abril de 2015

Helena Guimarães //// Saudades


Esta saudade está
a transformar-se em ânsia
que me dói,
me corrói,
me faz cair em fantasia
quando,ao nascer do dia,
deitada na minha cama,
relembro as tuas mãos
a explorar-me o corpo,
o teu olhar absorto,
perdido dentro do meu,
tua boca no meu peito,
e todo aquele teu jeito
de procurares o carinho,
o cabelo em desalinho
macio entre os meus dedos,
esvaziando os meus medos
destruindo a solidão!
Amo-te!!!

Helena Guimarães

(No livro:CONTIGO à LAREIRA)  ANO   2012

""    Quem dirá aos
       amantes que o amor há-de despir
       o acontecido
       e passará pela mão
       como passou o frio
       de flôr em flôr ?  ""

Armindo Trevisan

( in  "" Quem dirá aos amantes "" ,
Antologia da Poesia Brasileira Contemporãnea  )



Laura Santos //// LUA

Toda a verdade do mundo
se revela na pequena estrela
que me ilumina nas mãos
a toada de uma morna lenta
se o meu pensamento veloz
dentro de mim inventa
a forma de te procurar.
A lua acomoda-se à janela
como vaga luz em castiçal
que nos meus olhos ateasse
o voraz lume do teu nome
e a tua muda voz em sopro
quente a mim chegasse.

Laura Santos   





Clique no endereço  :

Lua, de Pedro Barroso, um enorme poeta de canções.

https://youtu.be/dXbvdI5GXxg

terça-feira, 7 de abril de 2015

Helena Guimarães //// As tuas mãos

 
 
as tuas mãos longas
e morenas
que exprimem do gesto
a subtileza
são lindas, são etéreas
são subtis.
Parecem aves
esvoaçando presas...
Como gosto
de, perdida em pensamento,
seguir as figuras
que, no espaço,
as tuas mãos desenham
em sentido,
e cingi-las ao meu corpo
qual abraço...
 
 
 
Como gosto
quando apontam o universo,
os dedos estirados
como setas...
me elevam, me redimem, me libertam.
Me encontram o perdão
do meu pecado.
Me acalmam,
me sublimam,
como ascetas.!!

Helena Guimarães
Do livro "" Intimidades "" / 1994