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sexta-feira, 26 de abril de 2024

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Consegues sentir o toque do que ainda será?










quinta-feira, 25 de abril de 2024

Ana Luísa Amaral

 

APR





Aprender pela minha gata 
o tom da liberdade: 
o estar quando se quer 
e o não estar quando não
- de coração sombrio 
a feliz coração 

em ronronar. 
Ah! tanta brandura há 
no seu bem-estar sem estar 
exactamente 

como eu. 
O pesadelo ausente 
da forma de se estar 
contente: uma alegria 
de ser gato 

ou gente. 
A tristeza banida? 
E o tom da liberdade? 
Feliz a tempo inteiro, 

a minha gata? 
Mas como, se as paredes 
são fechadas e as noites de miar 
uma utopia? 
Só no telhado e em pura nostalgia: 
o cheiro 

a tempo 
verdadeiro.


Ana Luísa Amaral 







quarta-feira, 24 de abril de 2024

Ne me quitte pas, Jacques Brel




É uma obra-prima de desespero e amor humano

terça-feira, 23 de abril de 2024

CATS - Memory (with lyrics)





Esta música sempre me faz pensar em todos os animais idosos em abrigos e resgatados. Parece o que eu sinto que eles devem sentir.




De SER POETA / Br.

 

Etílico Devaneio

 


Ainda que o calor seja enorme

O belo líquido que escorre, na taça,

Acorda o prazer que, em mim, dorme

E põe, no domingo, cor e graça.

Na mesa, o queijo de Canastra,

A carne, a água, o vinho, o pão,

Este mínimo de ração, que basta,

Para se ser feliz ouvindo uma canção.

A boa amizade, os gestos de carinho,

Combinam com o verde de La Mancha

Que até me sinto um Dom Quixotezinho

E ouso ver, no Lito, um Sancho Pança!

Maria Teresa Horta

 

APR




Assim... meu amor 
penetra o tempo 

as ancas devagar 
as pernas lentas 

o charco dos teus olhos 
e a laranja 
a palpitar dentro do meu ventre 

Assim... meu amor 
penetra o tempo 

a boca devagar 
os dedos lentos 

a raiva do punhal que enterras 
no sol pastoso 
do meu ventre 

Assim... meu amor 
penetra o tempo 

os rins devagar 
o espasmo lento


Maria Teresa Horta






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Entre o que de especial me acontece e acreditar que o sou, habita a subtileza de um desacerto incurável.

segunda-feira, 22 de abril de 2024

Amália Rodrigues - Lágrima






AMÁLIA RODRIGUES - LÁGRIMA



Amália não tinha estudos.Tirara apenas a instrução primária, o máximo que se poderia esperar na época e no meio social em que nasceu. Ela própria, numa segunda carta a Vitorino Nemésio, confirma isso mesmo:« Ai meu querido professor, eu nunca fui sua aluna, não tenho instrução nenhuma. Como é que posso entender o que o senhor quis dizer sem saber ler nem escrever?».

 Mas Amália era uma pessoa inteligente, intuitiva, sensível e adquiriu saber na convivência ao longo da vida. A Letra deste fado lindíssimo é de sua autoria e foi considerado pelos especialistas uma obra prima que no seu sentido profundo, à boa maneira fadista, significa: realidade/sonho/sofrimento de amor/disponibilidade para morrer» Merece ser escutado com os ouvidos da alma.

Juan Vicente Piqueras

 

APR





Para um poeta esquecido 

Tu não existes, diziam-te em pequeno. 

E procuraste o que não existe. 

Deste a tua vida a coisas que não havia. 
Não viste sequer 
o que estava a teu lado. 

Eras daquilo que não existia. 
Deste-te de antemão ao já perdido. 

Se hoje podemos dizer que exististe 
é porque durante uns anos 
respiraste o ar desta terra. 

E porque o que não existiu 
o perseguiste com poemas 
de cansada beleza onde hoje 
dás aos outros a tua voz, dás à vida 
o que não existiu, o que não tiveste.


Juan Vicente Piqueras






domingo, 21 de abril de 2024

Seamus Heaney

 

ABRIL





Maçons, quando iniciam uma construção,
Tenha o cuidado de testar o andaime;

Certifique-se de que as pranchas não escorreguem em pontos movimentados,
Fixe todas as escadas e aperte as juntas aparafusadas.

E ainda assim tudo isso acontece quando o trabalho termina
Exibindo paredes de pedra segura e sólida.

Então, se, minha querida, às vezes parece haver
Velhas pontes quebrando entre você e eu

Nunca tema. Podemos deixar os andaimes caírem
Confiantes de que construímos nosso muro.


Seamus Heaney






sábado, 20 de abril de 2024

Ana Luísa Amaral

 

APR




Em que meditas tu 
quando olhas para mim dessa maneira, 
deitada no sofá 
diagonal ao espaço onde me sento, 
fingindo eu não te olhar? 

Em que pensa o teu corpo 
elástico, alongado, 
pronto a vir ter comigo 
se eu pedir? 

As orelhas contidas em recanto, 
as patas recuadas, 
o que atravessa agora o branco dos teus olhos: 
lua em quarto-crescente, 
um prado claro? 

E quando dormes, como noutras horas, 
que sonhos te viajam: 
a mãe, a caça, a mão macia, o salto 
muito perfeito 
e alto, muito esguio? 

Onde: a noite sem frio 
que nos abrigará 
um dia 

e que há-de ser 
(só pode ser) 

igual?


Ana Luísa Amaral










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The Beach Boys "I Get Around" on The Ed Sullivan Show







sexta-feira, 19 de abril de 2024

Maria Oliver

 

ABRIL

Durante anos, todas as manhãs, eu bebia
da lagoa Blackwater.
Foi aromatizado com folhas de carvalho e também, sem dúvida,
os pés dos patos.

E sempre isso me acalmou
da tigela seca de um passado muito distante.

O que eu quero dizer é
que o passado é o passado,
e o presente é o que sua vida é,
e você é capaz
de escolher o que será,
querido cidadão.

Então venha para a lagoa,
ou o rio da sua imaginação,
ou o porto da sua saudade,

e coloque seus lábios para o mundo.
E viva
sua vida.


Maria Oliver






quinta-feira, 18 de abril de 2024

Meu Desejo - Alvares de Azevedo

 

Meu Desejo - Alvares de Azevedo

Meu desejo? era ser a luva branca
Que essa tua gentil mãozinha aperta:
A camélia que murcha no teu seio,
O anjo que por te ver do céu deserta....

Meu desejo? era ser o sapatinho
Que teu mimoso pé no baile encerra....
A esperança que sonhas no futuro,
As saudades que tens aqui na terra....

Meu desejo? era ser o cortinado
Que não conta os mistérios do teu leito;
Era de teu colar de negra seda
Ser a cruz com que dormes sobre o peito.

Meu desejo? era ser o teu espelho
Que mais bela te vê quando deslaças
Do baile as roupas de escumilha e flores
E mira-te amoroso as nuas graças!

Meu desejo? era ser desse teu leito
De cambraia o lençol, o travesseiro
Com que velas o seio, onde repousas,
Solto o cabelo, o rosto feiticeiro....

Meu desejo? era ser a voz da terra
Que da estrela do céu ouvisse amor!
Ser o amante que sonhas, que desejas
Nas cismas encantadas de langor!

Manuel Antônio Álvares de Azevedo (São Paulo, 12 de Setembro de 1831 — Rio de Janeiro, 25 de Abril de 1852)

Eugenio de Andrade

 

No centenário de Eugénio de Andrade - O que fizeste das palavras?

O que fizeste das palavras?

Que contas darás tu dessas vogais

de um azul tão apaziguado?


E das consoantes que lhes dirás,

ardendo entre o fulgor

das laranjas e o sol dos cavalos?


Que lhes dirás, quando

te perguntarem pelas minúsculas

sementes que te confiaram?


in Matéria Solar



Eugénio de Andrade, pseudónimo de José Fontinhas, nasceu em Póvoa de Atalaia, Fundão a 19 de janeiro de 1923, f. no Porto, 13 de junho de 2005.

Dica....

 


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O tempo desliza devagar pelo corpo.
Agarra-se à pele.
Quer ficar.

quarta-feira, 17 de abril de 2024

Eugénio de Andrade In “As Mãos e os Frutos”

 Foi para ti que criei as rosas.

Foi para ti que lhes dei perfume.
Para ti rasguei ribeiros
e dei às romãs a cor do lume.
Foi para ti que pus no céu a lua
e o verde mais verde nos pinhais.
Foi para ti que deitei no chão
um corpo aberto como os animais.

Eugénio de Andrade
In “As Mãos e os Frutos”



FOTO do AUTOR


Ana Luísa Amaral


(em Londres num «comer no local ou levar»)


Sou só eu 
respondi à empregada de café 
quando eu sentar quis 

Sou só eu 
mais ninguém 
só eu aqui descendente do mundo 
neurótica e distópica 
em curtos arremedos grosseiros 
e vulgares 

Sou só eu 
pedir um chá só ou só um chá 
que a sintaxe de nós 
permite estas permutas subtis 
a inglesa já não 

que só um chá pode bem ser 
mas não é um chá solitário 
Sou só eu sozinho 
só quero um chá 
mais nada 
e mais ninguém 


Ana Luísa Amaral