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quinta-feira, 27 de junho de 2019

Hamilton Ramos Afonso





Como um grão de milho
Como um pequeno grão de milho
que em terra fértil caiu,
é assim o meu amor por ti….

Germinou,
deu origem a uma pequena e frágil plantinha acarinhada todos os dias
para a defender do ciúme ,
da duvida 
e das dificuldades próprias
das diferenças que entre nós existem…

A verdade é que com ternura ,
carinho ,
persistência
e perseverança,
a planta cresceu ,
enrobusteceu
e vai dar fruto, 
multiplicando o grão de milho
que lhe deu origem …

E para cumulo do amor entre almas ,
calaremos as nossas palavras
falaremos apenas por linguagem gestual 
e com mestria
escreveremos o mais belo poema de amor 
na fusão dos nossos dois corpos…

Hamilton Ramos Afonso   

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Eugénio de Andrade





Photo: Erik Brede 



























Recomeço.
Não tenho outro ofício.

Entre o pólen subtil
e o bolor da palha,
recomeço.

Com a noite de perfil
a medir-me cada passo,

recomeço,
pedra sobre pedra,
a juntar palavras;

quero eu dizer:
ranho baba merda


Eugénio de Andrade

terça-feira, 25 de junho de 2019

Eugénio de Andrade






deita-te...
Entre os teus lábios 
é que a loucura acode, 
desce à garganta, 
invade a água.

No teu peito 
é que o pólen do fogo
se junta à nascente, 
alastra na sombra.

Nos teus flancos 
é que a fonte começa 
a ser rio de abelhas, 
rumor de tigre.

Da cintura aos joelhos 
é que a areia queima, 
o sol é secreto, 
cego o silêncio.

Deita-te comigo. 
Ilumina meus vidros. 
Entre lábios e lábios 
toda a música é minha.

Eugénio de Andrade

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segunda-feira, 24 de junho de 2019

Natália Correia






Acaso...
Decididamente a palavra
quer entrar no poema e dispõe
com caligráfica raiva
do que o poeta no poema põe.
Entretanto o poema subsiste
informal em teus olhos talvez
mas perdido se em precisa palavra
significas o que vês.
Virtualmente teus cabelos sabem
se espalhando avencas no travesseiro
que se eu digo prodigiosos cabelos
as insólitas flores que se abrem
não têm sua cor nem seu cheiro.
Finalmente vejo-te e sei que o mar
o pinheiro a nuvem valem a pena
e é assim que sem poetizar
se faz a si mesmo o poema.

Natália Correia   

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sábado, 22 de junho de 2019

OUTRA POESIA DE HUERTA





OUTRA POESIA DE HUERTA

Te sinto
Te sinto cada dia roçando-me invisível
Subtilmente impalpável.
E ainda sei que sempre havia te levado comigo
E eras sempre a suave, docemente impossível
Distante luminosa....
Te sinto cada dia cantar, mas não sei onde.
És algo que vive além de mim mesmo
E ainda que sempre sejas a nuvem e o horizonte distante
Senti teu beijo sobre a minha alma!
Meu espírito solitário te sonha em todas as coisas
Minha alma te busca por trás de toda emoção
Meu caminho está repleto de teu nome!
Distante? Onde estais? Onde estais?

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sexta-feira, 21 de junho de 2019

Albano Santos






Não sei porquê
hoje lembrou-me que
puzeste na mesa
aquela toalha de linho
onde as papoilas vermelhas
são beijadas pelo sol bordado
que te sai das mãos!...
Quis afastar esse pensamento
e fui até à margem do rio,
junto das margaridas que tanto gostavas...
Dei por mim a relembrar os tempos idos,
os nossos segredos,
os sonhos perdidos,
as histórias de amor,
os dias mais felizes...
E tudo parece que rebrilha
como pedrinhas de cor
entre as raízes...
Quem sabe, amanhã será primavera!...

Albino Santos

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quinta-feira, 20 de junho de 2019




Photo: Alekcej Tugolukoff



























Talvez a linha se acenda e continue 
ondeando a página e sendo nós só a margem 
de um domínio onde fulge a inocência, 
talvez se revele a transparência inicial 
em que a luz de estar a ver seja a palavra mesma. 

Vêm figuras que se espraiam e crescem 
até serem apenas ondulada memória. 
Adensam-se outros corpos e enterram-se no fogo. 
As linhas enovelam-se num delírio exacto. 
A alegria ilumina penumbras de volumes. 

Em tensos membros lúcidos e redondos 
move-se o desenhado corpo ligeiro 
e lento. Aumenta a densidade até ao centro 
de um deus que diz o esplendor silencioso. 
Ou só o ar ondeia num planalto de vento. 



António Ramos Rosa

segunda-feira, 17 de junho de 2019

Clarice Lispector






POESIA
(re)versos

Não te amo mais.
Estarei mentindo dizendo que
Ainda te quero como sempre quis.
Tenho certeza que
Nada foi em vão.
Sinto dentro de mim que
Você não significa nada.
Não poderia dizer jamais que
Alimento um grande amor.
Sinto cada vez mais que
Já te esqueci!
E jamais usarei a frase
Eu te amo!
Sinto, mas tenho que dizer a verdade
É tarde demais...

(Agora leia de baixo para cima)

Clarice Lispector



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Photo: Man Ray

















To fling my arms wide
In some place of the sun,
To whirl and to dance
Till the white day is done.
Then rest at cool evening
Beneath a tall tree
While night comes on gently,
Dark like me -
That is my dream!

To fling my arms wide
In the face of the sun,
Dance! Whirl! Whirl!
Till the quick day is done.
Rest at pale evening...
A tall, slim tree...
Night coming tenderly
Black like me. 


Langston Hughes 

sexta-feira, 14 de junho de 2019

Nuno Júdice





mãos...
Podia ser aí. Contigo. Com o teu corpo
ainda nu, ou vestido da luz que entra pelas 
persianas velhas, trazendo a tremura 
das folhas na trepadeira do quintal.

Podia ser de manhã, ou de madrugada, 
sabendo que teria de te abraçar para que não
desses pelo frio, com o quarto ainda 
húmido da noite, num fim de outono.

Podia não ter sido nunca, se não fossem 
assim as coisas: a tua mão ao encontro da 
minha, no tampo da mesa, como se fosse 
aí que tudo se jogasse, entre duas mãos.

Nuno Júdice

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quarta-feira, 12 de junho de 2019

Fernando Campos de Castro





MORRER DE AMOR

Acende as tuas mãos que o corpo pede
E deixa que depois tudo aconteça
Nas fontes do meu peito mata a sede
Até que tudo em mim se desfaleça
Afaga os meus cabelos com ternura
Afunda nos meus braços teus desejos
Respira em cada poro esta loucura
No oceano imenso dos meus beijos
Segreda-me palavras que enlouquecem
Navega no meu corpo em ondas loucas
Toquemos nossos lábios que se acendem
No fogo de prazer das nossas bocas
Desliza as tuas mãos pelo meu rosto
Beijando as minhas lágrimas de dor 
E deixa sobre mim esse teu gosto
Até que tudo em nós morra de amor

Fernando Campos de Castro


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terça-feira, 11 de junho de 2019

Margaret Fishback Powers.






POEMA
Pegadas na Areia


Sonhei que estava caminhando na praia 
juntamente com Deus.
E revi, espelhado no céu, 
todos os dias da minha vida.
E em cada dia vivido, 
apareciam na areia, duas pegadas : 
as minhas e as d’Ele.
No entanto, de quando em quando, 
vi que havia apenas as minhas pegadas, 
e isso precisamente 
nos dias mais difíceis da minha vida.

Então perguntei a Deus:
"Senhor, eu quis seguir-Te, 
e Tu prometeste ficar sempre comigo.
Porque deixaste-me sozinho, 
logo nos momentos mais difíceis?

Ao que Ele respondeu:
"Meu filho, Eu te amo e nunca te abandonei. 
Os dias em que viste só um par de pegadas na areia 
são precisamente aqueles 
em que Eu te levei nos meus braços".


Margaret Fishback Powers.
(amplamente divulgado como um poema de "autor desconhecido", mas foi escrito em 1964 por esta canadense)

A imagem pode conter: oceano, praia, água, céu, ar livre e natureza

segunda-feira, 10 de junho de 2019

Joaquim Pessoa, in 'Ano Comum'





Abraça-me


Abraça-me. Quero ouvir o vento que vem da tua pele, e ver o sol nascer do intenso calor dos nossos corpos. Quando me perfumo assim, em ti, nada existe a não ser este relâmpago feliz, esta maçã azul que foi colhida na palidez de todos os caminhos, e que ambos mordemos para provar o sabor que tem a carne incandescente das estrelas. Abraça-me. Veste o meu corpo de ti, para que em ti eu possa buscar o sentido dos sentidos, o sentido da vida. Procura-me com os teus antigos braços de criança, para desamarrar em mim a eternidade, essa soma formidável de todos os momentos livres que a um e a outro pertenceram. Abraça-me. Quero morrer de ti em mim, espantado de amor. Dá-me a beber, antes, a água dos teus beijos, para que possa levá-la comigo e oferecê-la aos astros pequeninos.
Só essa água fará reconhecer o mais profundo, o mais intenso amor do universo, e eu quero que delem fiquem a saber até as estrelas mais antigas e brilhantes.
Abraça-me. Uma vez só. Uma vez mais.
Uma vez que nem sei se tu existes.

Joaquim Pessoa, in 'Ano Comum'


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de Isabel De Carvalho Sousa





Há...
Há palavras que o coração tece 
com fios de seda.
Guardam sentimentos 
na emoção dos caminhos que ando rubros 
na voz da noite. 
São palavras vulgares 
que me acendem o sorriso 
quando preciso 
ser o teu horizonte.



 de Isabel De Carvalho Sousa
Foto recolhida na Net(não sei a autoria)

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sábado, 8 de junho de 2019

José Luís Peixoto





POESIA


À mulher mais bonita do mundo

Estás tão bonita hoje.

estás tão bonita hoje. quando digo que nasceram
flores novas na terra do jardim, quero dizer
que estás bonita.
entro na casa, entro no quarto, abro o armário,
abro uma gaveta, abro uma caixa onde está o teu fio
de ouro.
entre os dedos, seguro o teu fino fio de ouro, como
se tocasse a pele do teu pescoço.
há o céu, a casa, o quarto, e tu estás dentro de mim.
estás tão bonita hoje.
os teus cabelos, a testa, os olhos, o nariz, os lábios.
estás dentro de algo que está dentro de todas as
coisas, a minha voz nomeia-te para descrever
a beleza.
os teus cabelos, a testa, os olhos, o nariz, os lábios.
de encontro ao silêncio, dentro do mundo,
estás tão bonita é aquilo que quero dizer.

José Luís Peixoto

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sexta-feira, 7 de junho de 2019





POEMA PARA A BRANCA DE NEVE




Amo a brancura de tua pele
como me fere,
com a doce entrega
do azul do bico de teus seios,
fontes de mel, nascedouro de prazeres,
porto de precipícios, criadouro de desejos,
brinquedos lúdicos de sonhos infantis.
Ainda sinto os teus beijos....
Tua boca ainda passeia no meu sono
e ainda guardo os ardores insaciados
de desejos guardados
que soltos se expandirão
pela mansidão leitosa de tua pele
e ainda estão flutuando atrás de ti,
como fantasmas de paixão
que rondam terras desconhecidas
em busca da flor do gozo
que guardas entre as pernas
nos campos brancos de neves,
onde vicejam guardas filiformes, pelos negros,
onde nunca aportaram
os pingos de minha língua
seca ainda, chorosa, à míngua
do sêmen que há de brotar,
do germinar sem fim
do amor que há em ti,
em mim
e quer te ver esposa, menina, mulher
a gemer, gritar, escandalizar
ao dizer
que, no teu corpo, existe vida sim,
que te guardaste tanto tempo,
de modo quase santo,
a esperar por uma festa assim,
a esperar por quem te desse tanto amor,
a esperar a festa que chegou,
a esperar por mim!



Ilustração: Tours & Tickets.