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sexta-feira, 30 de setembro de 2016

vasco gato



segredo
.
segreda-me a canção dos dias...
sem que nos ouça a noite terrível
e deixa que dance em mim a voz,
a voz azul que é o lugar onde
o mundo não pára de nascer.


segreda-me o teu nome, agora,
e farei de nós o amor, a constelação,
o sonho de uma estação sem morte.



vasco gato

um mover de mão
assírio & alvim
2000  










quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Miguel Torga


Deixem
passar quem vai na sua estrada.
Deixem passar
Quem vai cheio de noite e de luar.
Deixem passar e não lhe digam nada

...

Deixem, que vai apenas
Beber água de sonho a qualquer fonte;
Ou colher açucenas
A um jardim que ele lá sabe, ali defronte.


Vem da terra de todos, onde mora
E onde volta depois de amanhecer.
Deixem-no pois passar, agora


Que vai cheio de noite e solidão
Que vai ser uma estrela no chão.



Miguel Torga   



sexta-feira, 16 de setembro de 2016

são reis

Apetece-me guardar-te assim
inteira
na minha mão...

Os teus olhos sorrindo
e apetecendo
e eu segurando o teu rosto
resvalando-me na pele
como se aos dedos acudisse
uma subita ternura
que eu não controlasse
como se à tua boca aflorasse
um subito desejo
de beijar a minha mão
presa já ao teu rosto
e eu de mergulhar nos teus olhos
já presos em mim



são reis   



 

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Fernando Campos de Castro

 
O TEU CHEIRO
 
 
 
...
Ainda e sempre , amor
é o teu cheiro
O cheiro do teu corpo que me falta
o teu sabor a sol , a céu e a sal
que me limita a língua e sobressalta
Ainda e sempre a tua boca
a rua mais comprida onde o desejo é risco , raiva
e febre louca
onde arrefeço o fogo do meu beijo
É no teu corpo , na tua pele
na duna do teu peito entumecida
que eu percorro e cavalgo a solidão
num cavalo de vento rumo à vida
Das tuas mãos abertas
Das coxas e das costas
Do frémito do sexo
e do perfil de estátua do teu rosto
Ainda e sempre , amor , é do teu cheiro
Do cheiro do teu corpo que eu mais gosto
 
 
 
Fernando Campos de Castro
Do livro : Violação da noite/ pag. 20 / ano 2000  
 
 
 
 
 
 

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

POEMA DO QUE TINHA DE SER




 
 
 

O fato é que de ti só quero
o que tens de diferente, de parecido e de melhor,
Mas, o pior, contigo, é muito bom também.
Nem quero saber das coisas que não quiser me dizer
Embora esteja doido para te dizer
Muito mais do que queres saber:
Palavras amorosas, dengos e mesmo desejos pervertidos,
Que trago comigo.

Ah! Me pego pensando no teu rosto
Como será quando estiveres alvoroçada
Por pegar teus seios,
Que receios terás
Se te lamber mais do que devo
Numa fantasia única
De que és o sorvete
Que sonhei quando criança.

A realidade é que, perto de ti,
Todo olhar meu é pornográfico
Como um gráfico
De uma realidade inevitável,
De um destino
Que não se pode fugir.

De: "Águas Passadas", Editora Per Se, 2013.

terça-feira, 13 de setembro de 2016

David Mourão-Ferreira

 
ilusões 
 
 
 
    
Deixa ficar comigo a madrugada,
para que a luz do Sol me não constranja.
Numa taça de sombra estilhaçada,
deita sumo de lua e de laranja.
Arranja uma pianola, um disco, um posto,
onde eu ouça o estertor de uma gaivota...
Crepite, em derredor, o mar de Agosto...
E o outro cheiro, o teu, à minha volta!
Depois, podes partir. Só te aconselho
que acendas, para tudo ser perfeito,
à cabeceira a luz do teu joelho,
entre os lençóis o lume do teu peito...
Podes partir. De nada mais preciso
para a minha ilusão do Paraíso.


 
David Mourão-Ferreira
 
 
 
 
 
 
 
 
 

Glória Salles

 
 
 
 
O tempo segue, caminhando lento.
Ignorando minha maior verdade
Nessa cruel espera moram as horas
Alheias a dor da imensa saudade
E num turbilhão, as lembranças....

Intensas refletem nos meus versos
Ferem, reavivando os sentidos.
Trazem velhos sonhos já dispersos
Não demora, porque hoje preciso.
Ver a saudade viva no teu olhar
Aninhada, protegida em teu peito.
Quero ouvir outra vez, teu respirar.
Divisando teu olhar, já concluo.
Se tiver o brilho do teu sorriso
Chovendo assim em minha seara
Tenho tudo, e de mais nada preciso.
Quebre as amarras, viole os sentidos.
Reviva o sonho, sem pressa de ir embora.
Quando trancar aquela porta, por favor.
Sem nenhum medo, lance a chave fora.

 

Glória Salles


 Arte: TANYA SHATSEVA   





 

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Clara Maria Barata

E depois partiste
Como se o teu destino fosse apenas ter pressa…partiste. Não soubeste ler o grito sofrido dos meus olhos, a mensagem perdeu-se na pequena distância que nos separava. As tuas mãos inquietas acenavam despedidas, falavam promessas de amanhãs, tropeçavas nas palavras, conjugavas o verbo amar num futuro impossível, inventavas sorrisos e gestos de ternura esfarrapada.
Agonizava o que ainda restava de mim no teu olhar.
Dizias que o tempo não lograria apagar o que n...
a carne se cravou pelo punhal da paixão, que os sonhos amanhecem sem fronteiras e as estrelas vigiam as noites mais sombrias.
Mentias. As estrelas adormeceram no cansaço dos dias, silenciou-se a voz do vento, o sol é uma memória diluída no tempo, as roseiras do jardim esqueceram as flores, entristeceram em canteiros esvaídos de esperança, só os espinhos reclamam espaço na terra seca e solitária, antes abençoada pela chuva dourada e pelo trinar das aves nas colinas do desejo.
Ceguei e ensurdeci. Poderei também ter perdido a voz quando, no inclemente deserto de mim, deixei de pronunciar a água do teu nome.



Clara Maria Barata   




 

domingo, 11 de setembro de 2016

Ana Luísa Amaral

 
REFLEXOS
 
 
...
Olho-te pelo reflexo
Do vidro
E o coração da noite

E o meu desejo de ti
São lágrimas por dentro,
Tão doídas e fundas
Que se não fosse:

o tempo de viver;
e a gente em social desencontrado;
e se tivesse a força;
e a janela ao meu lado
fosse alta e oportuna,

invadia de amor o teu reflexo
e em estilhaços de vidro
mergulhava em ti.
 
 
Ana Luísa Amaral  
 
 
 

ROUBADO A UM BLOG

 
 
ROUBADO  A  UM  BLOG
 
 
 
Rabisco indefinido para uma letra de canção
 
 
 
Vil perdão...
 
 
 
 
Eu perdoo você
e suas pequenas mentiras.
Suas grandes mentiras.
Suas mentiras
 
de todos os tamanhos.
 
Perdoo
as promessas de campanha,
as promissórias afetivas
seus ‘eujuros’ e 'euteamos'

  Perdoo a nudez fingida,
os seios oferecidos
as geometrias felizes
os trejeitos de Marilyn
e seus gozos de festim
.
Perdoo suas nuvens vazias de chuvas
seus minuanos, seus tsunamis
Perdoo os raros dias de sol
e sua ausência de verões

  Eu perdoo
 
 
Perdoo os seus boleros,
suas rumbas, suas dores
o aço frio dos punhais
o finco das bandarilhas
ardidas, urdidas
em minhas costas
e esta sangria imposta
feita de uis e ais
 
 
Perdoo você como
quem perdoa Judas.
Perdoo, principalmente,
seus pra sempre
 
 
 
 
 

sábado, 10 de setembro de 2016

Laura Santos


Impermanência

                                                            J.J. Cazin



                                                       Sinto em mim a falta de um alguém
                                                       A falta de um alguém que seja eu
                                                       Pois embora seja não sou porém
                                                       Diluída num sol que entardeceu

                                                        Sei que existo e não estou em mim
                                                        E de tanto me vislumbrar assim
                                                        Sendo o direito e o meu avesso
                                                        É difusa a noite que atravesso

                                                        Em mim fico e de mim me ausento
                                                        Quando tantas vezes me preciso
                                                         E só fico em mim por um momento

                                                         O encontro comigo é fugaz
                                                         O instante passa  só releva
                                                         O ser que em mim emerge e se desfaz   
 
 
 
 
Laura Santos    
 
 
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sexta-feira, 9 de setembro de 2016

Uma poesia de Alda Merini

 


Alda Merini                                                                              

Se tu vedi il mio uomo
carezzagli dolcemente la fronte
è lì che abita il suo grande pensiero.
Se tu vedi il mio uomo
affondagli un coltello nel cuore
e fagli uscire il grumo di sangue
della donna che l’ha ingannato.
Se tu incontri il mio uomo
bagnagli dolcemente le labbra,
ha sete da tanto tempo.
Ma se tu vedi il mio uomo
stenditi dolcemente vicino a lui
è un uomo che sa amare.


Se tu vires o meu homem
acaricia docemente a sua fronte
é ali onde vive o seu alto pensamento.
Se tu vires meu homem
enfia-lhe uma faca no coração
e deixa sair um coágulo de sangue
da mulher que o tenha enganado.
Se tu encontras o meu homem
molha-lhe docemente os lábios
que ele tem sede faz muito tempo.
Porém, se tu vires o meu homem
tendo-te docemente a seu lado
é um homem que sabe amar.

Carlos Drummond de Andrade

vivências 
 
 
 
    

































Ganhei (perdi) meu dia. 
E baixa a coisa fria 
também chamada noite, e o frio ao frio
em bruma se entrelaçam, num suspiro. 

E me pergunto e me respiro 
na fuga deste dia que era mil 
para mim que esperava
os grandes sóis violentos, me sentia 
tão rico deste dia 
e lá se foi secreto, ao serro frio. 

Perdi minha alma à flor do dia ou já perdera 
bem antes sua vaga pedraria? 
Mas quando me perdi, se estou perdido 
antes de haver nascido 
e me nasci votado à perda 
de frutos que não tenho nem colhia? 

Gastei meu dia. Nele me perdi. 
De tantas perdas uma clara via 
por certo se abriria 
de mim a mim, estrela fria. 
As árvores lá fora se meditam. 
O inverno é quente em mim, que o estou berrando 
e em mim vai derretendo 
este torrão de sal que está chorando. 

Ah, chega de lamento e versos ditos 
ao ouvido de alguém sem rosto e sem justiça, 
ao ouvido do muro, 
ao liso ouvido gotejante 
de uma piscina que não sabe o tempo, e fia 
seu tapete de água, distraída. 

E vou me recolher 
ao cofre de fantasmas, que a notícia 
de perdidos lá não chegue nem açule 
os olhos policiais do amor-vigia. 
Não me procurem que me perdi eu mesmo 
como os homens se matam, e as enguias 
à loca se recolhem, na água fria.

Dia, 
espelho de projeto não vivido, 
e contudo viver era tão flamas 
na promessa dos deuses; e é tão ríspido 
em meio aos oratórios já vazios 
em que a alma barroca tenta confortar-se,
mas só vislumbra o frio noutro frio. 

Meu Deus, essência estranha 
ao vaso que me sinto, ou forma vã, 
pois que, eu essência, não habito 
vossa arquitetura imerecida; 
meu Deus e meu conflito, 
nem vos dou conta de mim nem desafio 
as garras inefáveis: eis que assisto 
a meu desmonte palmo a palmo e não me aflijo 
de me tornar planície em que já pisam 
servos e bois e militares em serviço 
da sombra, e uma criança 
que o tempo novo me anuncia e nega. 

Terra a que me inclino sob o frio 
de minha testa que se alonga, 
e sinto mais presente quando aspiro 
em ti o fumo antigo dos parentes, 
minha terra, me tens; e teu cativo 
passeias brandamente 
como ao que vai morrer se estende a vista 
de espaços luminosos, intocáveis: 
em mim o que resiste são teus poros. 
E sou meu próprio frio que me fecho 
Corto o frio da folha. Sou teu frio. 

E sou meu próprio frio que me fecho 
longe do amor desabitado e líquido, 
amor em que me amaram, me feriram 
sete vezes por dia em sete dias 
de sete vidas de ouro, 
amor, fonte de eterno frio, 
minha pena deserta, ao fim de março, 
amor, quem contaria? 
E já não sei se é jogo, ou se poesia.



Carlos Drummond de Andrade

quinta-feira, 8 de setembro de 2016

GONÇALO SALVADO ////// FULGIDEZ

 

  

 




Como aves extraviadas
 
 
 
 
 
 
 
sob o torpor de tanta luz
nossas bocas
unem-se ansiosas,
ardem juntas
num delírio rubro,
ébrias de gemidos,
nuas, alucinadas,
seduzem-se,
perturbam-se,
embriagam-se,
entregam-se ferventes
e enfeitiçadas,
em êxtase bebem
o fragor do lume,
sorvem o ardor
e a cupidez do vinho,
mordem-se
como polpas tenras,
sumarentas,
inebriadas,
queimam-se,
ferem-se,
húmidas de tantos beijos,
de fogo tão sequiosas,
chamas convulsas
bruxuleando claras.
E quase morrem calcinadas,
exaustas, loucas, desvairadas,
num frémito de labaredas,
em fogueiras acesas, altas,
transfiguradas –
Serão centelhas vivas, alvoroçadas?
Fúlgidas quimeras abrasadas? 
 
 
Gonçalo Salvador

Fernando Campos de Castro





SERVE - TE  DE MIM


 
Intemporal
ofereço - te o meu corpo
como um animal submisso e casto
à espera do voo dos teus dedos
Sem dúvidas ou medos
inclina - te sobre mim e incendeia - me os olhos
com a luz dos teus ombros
Ao menos por uma noite serve - te de mim
e sacia todos os teus desejos
expondo na minha pele luxúrias adormecidas
Crava - te em mim e cansa - me
na satisfação adiada de todos os teus vícios
Grita de prazer montada no cavalo alado da fantasia
e mergulha no rio de suor e cheiro
que me cresce no corpo
Depois
extenuada
deita - te gloriosa  e resplandecente sobre mim
para que eu possa de mãos calmíssimas e brancas
abrir duas rosas vermelhas
nos teus seios eternamente soberbos  
 
 


Fernando Campos de Castro   







quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Tomaz Jorge



“Búzio”
 
 
 

Hoje não trago nada que dizer....
Sossega o teu rosto no meu peito
Repousa em mim a tua tristeza.
Ouve os segredos que te não digo
E a canção de forte esperança
Que germina e rompe devagarinho
Por todos os caminhos da vida,
Na pureza desta tarde,
Ao lusco fusco,
Abre comigo os olhos para os belos horizontes
Cada poente mistifica sempre
Uma nova madrugada.
Repousa em mim a tua tristeza.
Abre comigo os olhos para a vida.
Hoje a minha voz é de búzio
Fala baixo e em segredo
Numa canção que enche o mar, o mundo,
E germina e rompe devagarinho
Por sobre os escombros de luz
Deste poente que cai sobre o mar
Numa angústia de eternidade.
 
Tomaz Jorge
 
Arte: Búzio na areia , foto de Pedro Sousa  
 
 
 
 
 

terça-feira, 6 de setembro de 2016

Fernando Assis Pacheco

terça-feira, 6 de Setembro 2016


Falei de ti com as palavras mais limpas /// Fernando Assis Pacheco



Falei de ti com as palavras mais limpas
Viajei, sem que soubesses, no teu interior.
Fiz-me degrau para pisares, mesa para comeres,
tropeçavas em mim e eu era uma sombra
ali posta para não reparares em mim.


Andei pelas praças anunciando o teu nome,
chamei-te barco, flor, incêndio, madrugada.
Em tudo o mais usei da parcimónia
a que me forçava aquele ardor exclusivo.


Hoje os versos são para entenderes.
Reparto contigo um óleo inesgotável
que trouxe escondido aceso na
minha lâmpada

 brilhando, sem que soubesses, por tudo o que fazias.
 
 
 

Fernando Campos de Castro

 
 
 
OLHO AS MINHAS MÃOS
 
 
 
 
Olho as minhas mãos
e o que vejo é este frio vazio e solidão e nada
A corola esbatida do teu último beijo
e em fios de angústia
aquela madrugada
 
 
Escorrem - me dos dedos restos do teu nome
e em sílabas geladas
o teu corpo desnudo me aflora aos olhos
que em teu nome fechei e expus a tudo
 
 
Olho as minhas mãos e o que vejo é sangue
é sal do teu corpo de desejo comungando o meu corpo
em desvario
 
 
Com estilhaços de bruma rememoro a tua carne em fogo
e de remorso choro
olhando as minhas mãos de febre e frio


Fernando Campos de Castro

Do livro :  Violação da Noite / 2000 



domingo, 4 de setembro de 2016

Fernando Campos de Castro

 
 
 
NOCTURNO  PARA DOIS
 
 
Vem... a mesa já está posta para os dois
Sobre a toalha feita em malmequeres
Já pus a vela acesa
para depois pôr a tocar o disco que preferes
Vamos fazer a nossa sinfonia
Eu...eu tocarei piano e tu cantarás esta canção
de sonho e alegria que com amor te dou
e tu me dás.
Vem...que a noite é poema que te dou
no fogo da lareira apetecida
aquela que o amor incendiou trazendo a luz de novo
à minha vida
Vamos fazer aqui o universo
Eu...eu dar-te-ei  estrelas que acendi nesta paixão
que pus em cada verso que com amor invento para ti
Vem amor...envolta em rosas cravo e hortelã
ouvir este Nocturno de Chopin
e todo o resto amor  virá depois
Vem amor...envolta numa onda de paixões
matar esta fogueira de  emoções
até que a noite morra entre nós dois.



FERNANDO  CAMPOS DE CASTRO

Do livro de poemas  VIOLAÇÃO DA NOITE
Edição ; Maio de 2000

Nasceu em Lever  : Vila Nova de Gaia em 27 de Agosto de 1952/ PORTUGAL






Nocturno de Chopin 

Clique no endereço ;

https://youtu.be/9E6b3swbnWg  

  










sexta-feira, 2 de setembro de 2016

Laura Santos

A pomba

 
 
 
 
Sonhei que o teu corpo era um riacho.
Nas tuas margens plantei todas as sementes;
De ti tudo nasceu, tudo transformaste:
O que sonhei, o que sonhaste.
Do sol veio a luz,
No teu corpo lavrado floresci.
Depois nem sei, vi que mudaste.
Já não eras riacho, eras fonte seca
Onde mirei o meu olhar.
Do teu corpo nu brotou a árvore,
Dos teus cabelos revoltos, como folhas, o silêncio
As minhas mãos poisaram como pássaros
Nas tuas mãos abertas como pontes.
Tua boca debiquei e tu sorriste.
Do nada surgiu o teu peito branco,
Nas tuas costas graníticas me sentei.
Debrucei-me sobre ti, uma nuvem surgiu;
Do céu dos teus olhos, como grãos
Gotas caíram.
Sequiosa pomba mensageira, uma bebi.
Passei teu território, a fronteira.
Voltei de novo a ti mas não te vi.
Diz-me meu amor porque voaste...
 
 

Laura Santos   
 
 
 

quinta-feira, 1 de setembro de 2016

rui amaral mendes

visões

...







perco-me na visão
desse teu corpo lânguido
que agora se entrega ao meu olhar.
nas sombras que se projectam
vislumbro o erotismo de dois corpos
que se compreendem,
autenticam,
por entre abandonos
às linguagens idiossincráticas
e à natureza metafísica e intemporal
do desejo.
lábios tumescidos e ardentes
aspiram a tez láctea que reveste
quem és.
cabelo seríceo cai
sobre teus ombros afagando docemente
o rosto de menina carente
onde desponta a malícia da
feminilidade felina de um olhar.
o contorno delicadamente decalcado
dos teus seios:
montes e vales de alabastro
onde me perco
rumo à origem do mundo.
por fim
o cheiro do teu corpo depois do amor:
eu em ti, tu em mim,
um no outro.
 
 

rui amaral mendes in triptico [2016]   
 
 
 

João Dimas Fiotte

 
 
 
 
Sempre soubemos que um dia seria assim
era tarde, muito tarde...Tarde de mais!...
a tristeza fazia sentir-se, como as paredes do inverno frio
nenhum de nós queria dizer o ultimo adeus!
as flores do tempo murcharam lá atrás, no esquecimento dos lábios arrefecidos
lentamente apertei os sapatos na convicção de que jamais tornaria a fazer o caminho de volta.
Os poemas secaram na cama que foi dos dois.
Agora só me resta erguer os olhos molhados e enxuga-los pelo caminho.
Chegou o momento de ganhar asas, esquecer todos silêncios, ser audaz e mergulhar no abismo ...
Sim irei... Antes que o meu coração esqueça o susto e a boa surpresa.
Ainda acredito que o amanhã tenha pele de veludo e voluptuosa paixão no peito.
Foi bom, enquanto foi bom. Sempre soubemos que um dia seria assim !
 



Autor: João Dimas Fiotte