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sábado, 31 de dezembro de 2016

Carlos Drummond de Andrade


RECEITA DE ANO NOVO





Para você ganhar belíssimo Ano Novo...
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser;
novo até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?)


Não precisa
fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumidas
nem parvamente acreditar
que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.


Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.  





Carlos Drummond de Andrade   



Foto de Hamilton Ramos Afonso -poesia.

sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

Almeida Garrett

Este inferno de amar !



Este inferno de amar — como eu amo!
Quem mo pôs aqui n’alma… quem foi?
Esta chama que alenta e consome,
Que é a vida — e que a vida destrói —
Como é que se veio a atear,
Quando — ai quando se há-de ela apagar?
Eu não sei, não me lembra; o passado,
A outra vida que dantes vivi
Era um sonho talvez… — foi um sonho —
Em que paz tão serena a dormi!
Oh! que doce era aquele sonhar…
Quem me veio, ai de mim! despertar?

Só me lembra que um dia formoso
Eu passei… dava o Sol tanta luz!
E os meus olhos, que vagos giravam,
Que fez ela? Eu que fiz? — Não não sei
Mas nessa hora a viver comecei…  


Almeida Garrett

quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

Elisa Salles


 
Revelação ?

As vezes ( Não poucas) admito;
me assusto com o andar dos meus pensamentos.
...Questiono minha sanidade
Ou minha insanidade.
Que seja!
O fato, é que realmente não sei
Não sei de nada!
Será que minha vida não passa de um sonho,
devaneio da mente de alguém?
Ou de Deus.
Quem poderá saber se não sou apenas um sonho do criador?
Se tudo é abstrato?
Uma poeira ao vento de deserto?
Desenhado pelo grande arquiteto.
Penso que em qualquer momento
simplesmente deixarei de ser.
...No meu lugar
pequenos fragmentos de um flash;
vasculhados na memória perdida.
Apenas um sonho.
Nada além disso.
Loucura
ou
revelação?
Vai saber...   


Elisa Salles     

Foto de Hamilton Ramos Afonso -poesia.



quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

António Carlos Cortez
























sublinho a tua pele como num mapa
os lugares a descobrir um sinal para seguir
o sangue a absoluta nudez o sublinhado
das frases como corpo vago sem sintaxe neutro
desarmo-te os lábios como se captasse
em ti uma íntima mão incendiária cujo limiar
desconhecesse como quem desconhece
o caminho mais perto para casa
marco cada sílaba de um rosto que foi meu
e oculto a lágrima existente no poema quero
o limite de distâncias entre a luz a escuridão
e recuso a realidade absoluta e recuso todavia
a indistinta pulsão o ímpeto a combustão total
o fogo anárquico   preciso no mapa a letra



António Carlos Cortez

Maria do Rosário Pedreira ///// Imutável.....

 Imutável.....
...

Nada mudou. Ao fim de tantos anos, o meu
passado é ainda o mesmo passado - nenhum
rosto diferente para desviar o rio da memória,
nenhum nome depois. Para te esquecer,


devia ter partido há muito tempo, como viajam
as aves de verão em verão. E tentei; mas as malas
abertas sobre a cama eram livros abertos, e eu
nunca deixei um livro pela metade. Por


ter ficado, nada mudou jamais - e o meu passado é
ainda o nosso passado; e o rosto que tinha antes
de me deixares é o que o espelho me devolve no
presente - embora outros me digam que o


que vêem na superfície fria desse lago é um vinco
na água, uma mulher muito mais velha do que eu.   




Maria do Rosário Pedreira     

Foto de Antonio Maria.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

de Mário de Andrade

TÃO LONGE, TÃO PERTO.



Este feliz desejo de abraçar-te,
Pois que tão longe tu de mim estás,
Faz com que te imagine em toda a parte
Visão, trazendo-me ventura e paz.
Vejo-te em sonho, sonho de beijar-te;
Vejo-te sombra, vou correndo atrás;
Vejo-te nua, oh branco lírio de arte,
Corando-me a existência de rapaz…
E com ver-te e sonhar-te, esta lembrança
Geratriz, esta mágica saudade,
Dá-me a ilusão de que chegaste enfim;
Sinto alegrias de quem pede e alcança
E a enganadora força de, em verdade,
Ter-te, longe de mim, juntinho a mim
.


  ( "Eterna Presença" Poema de Mário de Andrade )

Lembrança de Miguel Torga

    Lembrança de Miguel Torga

    Ponho um ramo de flores ...
    na lembrança perfeita dos teus braços;
    cheiro depois as flores



    e converso contigo
    sobre a nuvem que pesa no teu rosto;
    dizes sinceramente
    que é um desgosto.


    Depois, 
    não sei porquê nem porque não,
    essa recordação
    desfaz-se em fumo;
    muito ao de leve foge a tua mão,
    e a melodia já mudou de rumo.


    Coisa esquisita é esta da lembrança! 
    Na maior noite,
    na maior solidão,
    sem a tua presença verdadeira,
    e eu vejo no teu rosto o teu desgosto,
    e um ramo de flores, que não Foto de Antonio Maria.
    existe, cheira!

domingo, 25 de dezembro de 2016

O erotismo.....

O erotismo  



Gosto do erotismo das palavras doces
que me chegam pelos ouvidos devagar,

...
bem
devagar...



Para dar tempo à alma para as descascar,
como se descasca uma manga madura sumarenta a pingar de doce...



E saborear devagar,
bem
devagar...


Foto de Antonio Maria.

sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

POEMA DA ESPERA



     DA ESPERA

    Talvez seja melhor
    Que não venhas.
    Ou, melhor ainda se nunca...
    tivesses vindo.


    Porque se assim fosse
    Não sentiria
    O que estou sentindo
    Tamanha ausência de significado.


    Talvez seja melhor
    Que não venhas.
    Podes não ser
    Mais nada do que foi
    E só matar
    O que houve entre nós dois.


    Tanto tempos separados
    Deve fazer diferença
    E se, de repente,
    Somos dois estranhos?


    Não, é melhor que não venhas.
    Melhor permanecer, como agora,
    Sem saber por quais caminhos,
    Lugares e bancos
    Os teus sonhos repousam.


    No entanto há uma parte de mim
    Que insiste
    Em que, de fato, jamais partistes.
    E ainda sonha
    Com os dias gloriosos
    De tua volta
    E me sussura
    Que não te esquecerei.


    Talvez seja melhor que não venhas-
    Repito, ansioso, por ouvir tua voz rouca
    Me chamar, novamente, de “Meu lindo”!


Foto de Antonio Maria.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

AOS MEUS SEGUIDORES DE TODO O MUNDO...

Foto de Fátima Gomes.






Para todos os  cibernautas incluíndo uma ""  seguidora fiel...""  da cidade de MAINZ/ GERMANY 

e UM NOVO ANO DE 2017 , pleno de muita felicidade , saúde  e ainda e que é o essencial  muita 

PAZ.

Ary dos Santos, in 'Liturgia do Sangue'

Desespero! 




Não eram meus os olhos que te olharam ...
Nem este corpo exausto que despi 
Nem os lábios sedentos que poisaram 
No mais secreto do que existe em ti.


Não eram meus os dedos que tocaram 
Tua falsa beleza, em que não vi 
Mais que os vícios que um dia me geraram 
E me perseguem desde que nasci.


Não fui eu que te quis. E não sou eu 
Que hoje te aspiro e embalo e gemo e canto, 
Possesso desta raiva que me deu


A grande solidão que de ti espero. 
A voz com que te chamo é o desencanto 
E o esperma que te dou, o desespero.   




Ary dos Santos, in 'Liturgia do Sangue'    


Foto de Antonio Maria.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

POEMA De Laura Santos


Aromas
...

Sonhei que cheirava a café acabado de fazer
enquanto o teu corpo amanhecia.
A tua pele cheirava a tangerinas,
a minha, a amoras rubras e silvestres,
fragrâncias quentes e finas
ao canto de cada entardecer
quando te desnudas e te vestes.
Na breve penumbra das horas
sonhei que cheirava a rosmaninho,
a frescos coentros acabados de cortar,
se te aproximavas de mansinho...
enquanto preparava secreto manjar.
Odores salgados de maresia.
Algo me invadia; perfumes de anis,
alecrim, poejo, manjericão.
Uma paz de hortelã, de tomilho,ou de limão,
de maçãs vermelhas e conversas
saboreadas ao contacto da tua mão.
Sei que cheirava altos pinheiros,
floridos aloendros, campos de alfazema,
odores muito mais intensos
do que poderia escrever em poema.
Cheiro a estevas e terra molhada,
a roupa lavada com sabão
despida na prévia madrugada.
Desejaria teu corpo aroma
a anoitecer perto do meu.
Ou a amanhecer de repente,
brisa canção a rodopiar
num prado perto do céu.
Perdi o sentido do olfacto.
Que sonho inventado é este,
ilusório e contrafeito,
este tormento em doce retrato,
leve e caricato, 
que trago no meu peito?...  



Laura Santos     

Foto de Antonio Maria.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

    POESIA   
    ...me chama de.........
    As time goes by
    ...
    Meu bem,
    Me chama de Humphrey Bogart
    Que eu te conto Casablanca.
    Me tira esse sobretudo;
    Sobretudo, conta tudo
    Que eu te dou uma rosa branca.
    Meu bem,
    Me chama de Humphrey Bogart...
    Te dou carona em meu carro
    Chevrolet — que sou bacana;
    Te levo, meu bem, pra cama
    Fumamos nossa bagana;
    Te provo que sou sacana...
    Te faço toda a denguice:
    Te dispo que nem a Ingrid,
    Te dou filhos de montão
    Só pra te ver sufocar...
    Mas me chama de Humphrey Bogart!
    Faço chover colorido
    Como num bom musical.
    Te chamo de Lauren Bacall!
    Te danço, te canto, te mostro,
    Entre as pernas, meu bom astral...
     
    Tanussi Cardoso

    Foto de Antonio Maria.

Sonhadora......

SOU UM POEMA EM SETEMBRO  



No meu poema...há uma noite vestida de ti...onde te aguardo já serena...despida de Primavera e vestida de Outono...esperei rosa em botã...o...na claridade de fim de tarde...doce cálice de silêncio...sobre as cinzas do meu corpo derramado...esperando no outro lado de mim...ausente da minha alma...na distância das mãos...no vazio das madrugadas...na voz que foi grito e hoje murmura o teu nome num sussurro...na serenidade do nada...crepúsculo do tempo...sou uma noite em Setembro.
Sou o poema que não leste...as palavras de amor que não disseste...os lábios que não beijaste...o rosto que não acariciaste...as mãos que não sentiste...o afago que não deste...o corpo que não tocaste...sou o pensamento que te leva ao infinito...o abraço perdido na distância...o murmúrio da tua pele...o toque dos meus dedos...dizendo baixinho...meu amor.
Sou o sonho que de noite te visita...sou a madrugada que te beija de mansinho...a mão que te acarícia docemente...sou a lua que pousa suavemente no teu rosto...sou o teu poema...escrevo-te na minha pele...bebo-te no meu olhar...sacio-me no teu desejo.
Sou flor de Outono...sabor a mel...idade madura...poema por escrever...grito de prazer...gemido de amor...sou a loucura que do teu corpo escorre...sou o mar...sou o vento que acarícia as marés...sou o dia que percorre as memórias...sou o corpo no embalo do amor...sou o pensamento...sereno e livre...a asa que pousa em ti...sou o que tu sentes...o teu sonho da madrugada...a boca que sonhas...o teu abraço eterno.
Hoje meu amor...queria dar-te o azul dos meus sonhos...queria escrever-te um poema de amor...falar-te do luar que beijou o meu corpo...das madrugadas que afagaram o meu olhar...das carícias abandonadas no meu cabelo...ser a voz que nos teus sonhos te acorda...que te segreda desejos...as mãos que te percorrem...o sonho que te afaga o corpo...a tua noite...num corpo de mulher vestido de desejo.
Hoje meu amor...queria soltar a loucura que existe em mim...abraçar em ti a madrugada...voar no teu corpo...pousar na tua pele...beijar levemente os teus lábios e deixar em ti todas as palavras do meu corpo...queria ser quem te espera nua no silêncio da noite.
Hoje meu amor...anoiteci tão mulher...tão feita de momentos...com uma saudade louca na minha pele...queria no teu corpo ser mar...nos teus braços ser onda...e nesse embalo descançar depois de uma noite de amor...percorrer o teu corpo no silêncio dos meus lábios.
Hoje meu amor amanheci tão nua...hoje queria ser uma manhã em Setembro  



Sonhadora     

Foto de Fatima Pereira.


sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

alexandra

Permaneces aqui
e a tua voz é este silêncio
que fecunda as paredes da casa
e grita a tua ausência a cada dia
permaneces em mim
e os teus passos ecoam nos lugares
trancados no tempo
povoam meus sonhos agrilhoados
permaneces
no odor lilás da glicínia 
cosido à alma dos dias
e das madrugadas frias
estás em mim
como água que não mata 
 esta insaciável sede de ti


alexandra,
 

Arte: Mariska Karto
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Feliz Natal e...já agora, Feliz Ano Novo!



(O meu presépio favorito)

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Maria Olinda Maia

Ao teu lado...

De mãos dadas
flutuamos na caricia
de cada gesto envolvente.

...

Percorro a tua alma
vou ao encontro do teu olhar
e entro nas profundezas do teu ser.


Nas tuas palavras eu estou,
é um toque teu em minha alma...
Apenas tu
lês os meus olhos
o meu pensar...
Só tu
tens esse poder.


A minha mente voa
nas asas da tua ternura
liberto emoções
e achonchego-te em mim.
Acaricio o rosto da tua alma
com um sorriso de amor.






Maria Olinda Maia




Uma poesia de Ismael Enrique Arciniegas


RIMA                                                                             
Ismael Enrique Arciniegas

Cuando caigan las hojas y vayas
Al camposanto mi cruz a buscar,
En medio de flores
y en humilde rincón la hallarás.

Para que adornes tus rubios cabellos
y formen diadema de amor,
Coge, bien mío, las flores,
Las flores nacidas de mi corazón.

Esas flores son todos los versos
Que pensé a tu lado, pero no escribí;
Las palabras de amor y ternura
Que nunca mi labio te pudo decir.

RIMA

Quando as folhas caem e vão

ao cemitério minha cruz buscar,

Em meio à flores

E num humilde canto a acharás.

Para que adornes teus ruivos cabelos

e formem um diadema de amor,

Tome, meu bem, as flores,

As flores nascidas do meu coração.

Estas flores são todos os versos

Que pensei a teu lado, porém, não escrevi;

As palavras de amor e ternura

Que nunca meus lábios te poderiam dizer.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2016


Tu, a quem a vida pouco deu,
que deste o nada que foi teu
em gestos desmedidos...

Tu, a quem ninguém estendeu a mão
e mendigas o pão dos teus sentidos,
homem só, meu irmão!

Tu, que andas em busca da verdade
e só encontras falsidade
em cada sentimento,
inventa, inventa amigo uma canção
que dure para além deste momento,
homem só, meu irmão!

Tu, que nesta vida te perdeste
e nunca a mitos te vendeste
– dura solidão –,
faz dessa solidão teu chão sagrado,
agarra bem teu leme ou teu arado,
homem só, meu irmão!  



 Luiz Goes   


terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Francisco Valverde Arsénio


Adormeci sobre este poema

inacabado,
esqueci as palavras
antes de o sonho me embalar,
apertei os dedos
em dormência
onde os versos se aconchegaram.

Bate-me no peito

aquele instante nosso
e as letras formam
pequenas partículas dispersas.
Não quero mais marés,
quero-te oceano de águas puras,
quero-te no bulício dos amantes.

Adormeci sobre os olhares que trocámos

e o momento em que me sorriste.

Calada,

a minha voz sai dos sonhos
e confunde as nuvens,
é um grito de boca cerrada.

Adormeci contigo nos meus braços.   



Francisco Valverde Arsénio