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quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Maria Mamede //// Ousadia.....


 
Amigos,
ousem ainda inventar o Sol
esse astro criador que a terra
anima
essa estrela que produz
e ensina
a ajudar na produção
perene…
ousem ainda nas manhãs
cinzentas
em que o frio faz bater
o dente
inventar essa luz, ou diferente
gerando no coração
o que a produz…
ousem, ousem sempre
a cada ano
reinventar a Paz
como agasalho
uma paz que se vista
ou paz trabalho
que poderá ser pão
de quem resista…
e não se cansem nunca
de ousar
inventar palavras
e plantar
as que podem dar frutos
de bonança;
a vida sem paz,
é flor, murcha no ramo
por isso, ousemos
a cada novo ano
teimosamente
reinventar a esperança!

Maria Mamede

31/dezembro/2014

(A todos os Amigos e Amigas espalhados/as pelo mundo.)

terça-feira, 30 de dezembro de 2014

A todos um BOM ANO 2015





Laura Santos ///// A pomba

     
                                              Sonhei que o teu corpo era um riacho.
                                              Nas tuas margens plantei todas as sementes;
                                              De ti tudo nasceu, tudo transformaste:
                                              O que sonhei, o que sonhaste.
                                              Do sol veio a luz,
                                              No teu corpo lavrado floresci.
                                              Depois nem sei, vi que mudaste.
                                              Já não eras riacho, eras fonte seca
                                              Onde mirei o meu olhar.
                                              Do teu corpo nu brotou a árvore,
                                              Dos teus cabelos revoltos, como folhas, o silêncio
                                              As minhas mãos poisaram como pássaros
                                              Nas tuas mãos abertas como pontes.
                                              Tua boca debiquei e tu sorriste.
                                              Do nada surgiu o teu peito branco,
                                              Nas tuas costas graníticas me sentei.
                                              Debrucei-me sobre ti, uma nuvem surgiu;
                                              Do céu dos teus olhos, como grãos
                                              Gotas caíram.
                                              Sequiosa pomba mensageira, uma bebi.
                                              Passei teu território, a fronteira.
                                              Voltei de novo a ti mas não te vi.
                                              Diz-me meu amor porque voaste...
 
Laura Santos 

Para acompanhar este poema, escolhi  " Cucurrucu Paloma", na interpretação deCaetano Veloso para o filme de P. Almodóvar " Hable con ella" de 2002 




segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Wislawa Szymborska //// Acasos..............


Ambos estão convencidos
que os uniu uma paixão súbita.
É bela esta certeza,
mas a incerteza é mais bela ainda.
Julgam que por não se terem encontrado antes,
nada entre eles nunca ainda se passara.
E que diriam as ruas, as escadas, os corredores
onde se podem há muito ter cruzado?
Gostaria de lhes perguntar
se não se lembram -
talvez nas portas giratórias,
um dia, face a face?
algum “desculpe” num grande aperto de gente?
uma voz de que “é engano” ao telefone?
- mas sei o que respondem.
Não, não se lembram.
Muito os admiraria
saber que desde há muito
se divertia com eles o acaso.
Ainda não completamente preparado
para se transformar em destino para eles,
aproximou-os e afastou-os,
barrou-lhes o caminho
e, abafando as gargalhadas,
lá seguiu saltando ao lado deles.
Houve marcas, sinais,
que importa se ilegíveis.
Haverá talvez três anos
ou terça-feira passada,
certa folhinha esvoaçante
de um braço a outro braço.
Algo que se perdeu e encontrou?
Quem sabe se já uma bola
nos silvados da infância?
Punhos de poeta e campainhas
onde a seu tempo o toque
de uma mão tocou o outro toque.
As malas lado a lado no depósito.
Talvez acaso até um mesmo sonho
que logo o acordar desvaneceu.
Porque cada início
é só continuação,
e o livro das ocorrências
está sempre aberto ao meio.

Wislawa Szymborska  


domingo, 28 de dezembro de 2014

Maria do Rosário Pedreira ///// Imutável.....


Nada mudou. Ao fim de tantos anos, o meu
passado é ainda o mesmo passado - nenhum
rosto diferente para desviar o rio da memória,
nenhum nome depois. Para te esquecer,
devia ter partido há muito tempo, como viajam
as aves de verão em verão. E tentei; mas as malas
abertas sobre a cama eram livros abertos, e eu
nunca deixei um livro pela metade. Por
ter ficado, nada mudou jamais - e o meu passado é
ainda o nosso passado; e o rosto que tinha antes
de me deixares é o que o espelho me devolve no
presente - embora outros me digam que o
que vêem na superfície fria desse lago é um vinco
na água, uma mulher muito mais velha do que eu.

Maria do Rosário Pedreira  




sábado, 27 de dezembro de 2014

Laura Santos

Na hora em que de ti já pouco resta
a noite será friamente escura
iluminada por fogo de artifício.
E o jardim de luz lançado a certa altura
túmulo de tempo; um desperdício,
desaba sobre a terra em sepultura.
Abram-se todas as janelas e portas,
que o novo ano nelas entre!
Saudade; que o vento a afaste
para o mutismo de todas as coisas mortas
e se desfraldem bandeiras a meia-haste.

Laura Santos 

Para terminar o ano, A Despedida (Der Abschied), sexta

parte da Canção da Terra(Das Lied von der Erde) de

Gustav Mahler
 



sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

David Mourão-Ferreira /// Despojados


Entremos, apressados, friorentos,
numa gruta, no bojo de um navio,
num presépio, num prédio, num presídio,
no prédio que amanhã for demolido...
Entremos, inseguros, mas entremos.
Entremos, e depressa, em qualquer sítio,
porque esta noite chama-se Dezembro,
porque sofremos, porque temos frio.
Entremos, dois a dois: somos duzentos,
duzentos mil, doze milhões de nada.
Procuremos o rastro de uma casa,
a cave, a gruta, o sulco de uma nave...
Entremos. despojados, mas entremos.
Das mãos dadas talvez o fogo nasça,
talvez seja Natal e não Dezembro,
talvez universal a consoada.

David Mourão-Ferreira  



quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

Florbela Espanca ///// Que tu és...




Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver!
Não és sequer a razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida!
 

Não vejo nada assim enlouquecida...
Passo no mundo, meu Amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!
 

Tudo no mundo é frágil, tudo passa...
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim!
 

E, olhos postos em ti, digo de rastros:
Ah ! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus : Princípio e Fim!...


(Florbela Espanca) 

Como manter a paixão acesa

Francisco José Viegas /// As minhas areias


Desenha, sobre um mapa onde as ilhas possam flutuar
e as brancas penínsulas se abandonem às aves,
a incerteza do maior amor ou a tranquila
oscilação dos barcos nas enseadas onde o Inverno
pode adormecer. Na solidão, na noite, não demores
o tempo entre os anéis, os dedos tocam sempre
esses despojos de antigas navegações.
Por isso, nas horas tranquilas , entre as falésias,
dedico-me a essa ocupação de recolher o que as marés
trazem às praias, como se fosse ao coração

Francisco José Viegas 


terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Laura Santos //// Música


Fabricarei nas tuas mãos os frutos do paraíso,
desenharei no teu sorriso o canto dos pássaros.
Tocarei tambores, limarei as arestas dos espaços
inventados nas orquídeas abertas.
Envolverei cada despertar em sonatas de magia
e em compassos de luz recuperarei como cristais
a sedução que me conduz.
Devolverei a melodia das baladas no momento
sentindo em cada andamento dos nossos braços
a cor original do som e do movimento.
Com tua música de gestos e partituras,
desenharei em canção quadros de esbeltas figuras.
Orquestrarei num tom mudo, a sinfonia do meu olhar aberto
no teu corpo musical desperto.
Depois, suave adágio, harmonia de flautas...
Sentir "a capriccio" o gosto de te ouvir como cravo
nos meus cabelos castanhos, apanhar do chão
claves de sol de todos os tamanhos.
Ritmar em tocata e fuga, na tua ausência lapidar
a presença que em mim, sem parar habitas.

Laura Santos






sábado, 20 de dezembro de 2014

"Starry Starry Night" de Don McLean.







"Quero dormir e sonhar um sonho que em cor me afogue:
Verdes e azuis de Renoir
amarelos de Van Gogh."
                                             A. Gedeão in Movimento Perpétuo




                                        Adoro o silêncio das ermidas
                                        agradam-me os ecos nos prados.
                                        Risos de crianças, vozes bebidas,
                                        gestos que dispensam ser falados.

                                        Trilhos tortuosos dos regatos
                                         p'las escarpas íngremes dos montes,
                                         o som das cotovias p'los matos
                                         o musgo a adornar todas as fontes.

                                         Noite a lançar estrelas sobre a terra
                                         se da dor do dia me despeço
                                         e nos seus braços me aconchego.

                                         Branda luz que a madrugada encerra
                                         quando no seu colo adormeço
                                         e o meu sono é fundo desapego. 

BOM NATAL de 2014




A todos os que visitam este blog UM BOM NATAL


Vasco Cabral //// Delação !


A noite veio,
disfarçada em dia,
e ofereceu-me a luz,
diáfana como a Aurora.
Mas eu disse que não.
 
Depois veio a serpente
disfarçada em virgem
e ofereceu-me os seios e os braços nus.
Mas eu disse que não.
 
Por fim veio Pilatos,
disfarçado em Cristo,
e numa voz humana e doce
disse: "se quiseres eu dou-te o paraíso
mas conta a tua historia..."
Mas eu disse que não, que não, não, não!
 
E continuei um Homem!
E eles continuaram
os abutres do medo e do silêncio.
 
Vasco Cabral
 

tudo sobre eles

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Rainer Maria Rilke ///// Paradoxo...


Extingue os meus olhos: ainda te posso ver,
fecha-me os ouvidos: ainda te posso ouvir,
e sem pés ao teu encontro posso ir,
e até sem boca teu nome hei-de dizer.
Quebra-me os braços, posso abraçar-te
com o coração como se estendesse a mão,
pára-me o coração, o cérebro latejará,
e se ao meu cérebro deitares fogo então,
o meu sangue em mim te levará.

Rainer Maria Rilke


 

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

ARY DOS SANTOS //// Desespero

 
Não eram meus os olhos que te olharam
Nem este corpo exausto que despi
Nem os lábios sedentos que poisaram
No mais secreto do que existe em ti.
Não eram meus dedos que tocaram
Tua falsa beleza, em que não vi
Mais que os vícios que um dia me geraram
E me perseguem desde que nasci.
Não fui eu que te quis. E não sou eu
Que hoje te aspiro e embalo e gemo e canto,
possesso desta raiva que me deu
A grande solidão que de ti espero.
A voz com que te chamo é o desencanto
E o esperma que te dou, o desespero.
                                                       in "Liturgia do Sangue"

ARY  DOS SANTOS 


terça-feira, 16 de dezembro de 2014

David Mourão-Ferreira //// Despojados.....

Despojados...
Entremos, apressados, friorentos,
numa gruta, no bojo de um navio,
num presépio, num prédio, num presídio,
no prédio que amanhã for demolido...
Entremos, inseguros, mas entremos.
Entremos, e depressa, em qualquer sítio,
porque esta noite chama-se Dezembro,
porque sofremos, porque temos frio.
Entremos, dois a dois: somos duzentos,
duzentos mil, doze milhões de nada.
Procuremos o rastro de uma casa,
a cave, a gruta, o sulco de uma nave...
Entremos. despojados, mas entremos.
Das mãos dadas talvez o fogo nasça,
talvez seja Natal e não Dezembro,
talvez universal a consoada.

David Mourão-Ferreira 


Há noites que são feitas dos meus braços  e um silêncio comum às violetas  e há sete luas que são sete traços  de sete noites que nunca foram feitas    Há noites que levamos à cintura  como um cinto de grandes borboletas.  E um risco a sangue na nossa carne escura  duma espada à bainha de um cometa.    Há noites que nos deixam para trás  enrolados no nosso desencanto  e cisnes brancos que só são iguais  à mais longínqua onda de seu canto.    Há noites que nos levam para onde  o fantasma de nós fica mais perto:  e é sempre a nossa voz que nos responde  e só o nosso nome estava certo.    Natália Correia
Olhar...
O teu lugar é
onde olhos te olham.
Tu nasces
onde os olhos se encontram.
Suspensa por um chamar,
sempre a mesma voz,
parece haver só uma
com que todos chamam.
Caías,
mas não cais.
Olhos te prendem.
Tu existes
porque olhos te querem,

olham-te e dizem
que tu existes.

Hilde Domin




segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Natália Correia

Há noites que são feitas dos meus braços
e um silêncio comum às violetas
e há sete luas que são sete traços
de sete noites que nunca foram feitas
Há noites que levamos à cintura
como um cinto de grandes borboletas.
E um risco a sangue na nossa carne escura
duma espada à bainha de um cometa.
Há noites que nos deixam para trás
enrolados no nosso desencanto
e cisnes brancos que só são iguais
à mais longínqua onda de seu canto.
Há noites que nos levam para onde
o fantasma de nós fica mais perto:
e é sempre a nossa voz que nos responde
e só o nosso nome estava certo.

Natália Correia 


Poesia de amizade....




sábado, 13 de dezembro de 2014

Gonzalo Toreente Ballester ///// Mistério(s)...


[...]
- Não há quem entenda as mulheres.
- Não digas asneiras.
- A máxima faz parte da minha filosofia pessoal. Acho que as mulheres são como as ondas do mar. Sabe-se, porventura, a causa do seu movimento? Alguém já averiguou porque é que o mar é imenso e misterioso? No entanto, banhamo-nos nele e às vezes conseguimos navegá-lo. Às mulheres acontece-lhes o mesmo: são imensas, misteriosas e móveis. Lembre-se de D. Ximena. Não há forma de saber o que lhes passa lá dentro, nem por onde é que vão sair; mas, entretanto, deixam-se navegar tão lindamente. O segredo está em não lhes fazer muitas perguntas.

[...]
Gonzalo Toreente Ballester



sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Bruno de Paula

Como poderei ser um poeta,
se não tenho em meus versos
as palavras que definam
a cor-de-um-olhar ?
Não falo do olhar do dia a dia,
que nasce em cada esquina.
Esse, tem cor desbotada,
são de palavras gastas e desusadas.
Falo do olhar antes-de-uma-lágrima e,
do olhar depois-de-um-adeus.
Aquele, que faz um sentimento curvar-se,
uma alma calar-se.
Desse ...
Não tenho as palavras.
.
 Bruno de Paula 



Maria do Rosario Pedreira ///// DEI-TE O MEU CORPO COMO QUEM ESTENDE UM MAPA ANTES DE VIAGEM



Dei-te o meu corpo como quem estende
um mapa antes de viagem, para que nele
descobrisses ilhas e paraísos e aí pousasses
os dedos devagar, como fazem as aves
quando encontram o Verão. Se me tivesses
tocado, ter-me-ia desmanchado nos teus braços
como uma escarpa pronta a desabar, ou
uma cidade do litoral a definhar nas ondas.
Mas afinal, foste tu que desenhaste mapas
nas minhas mãos - tristes geografias,
labirintos de razões improváveis, tão curtas
linhas que a minha vida não teve tempo
senão para pressentir-se. Por isso, guardo
dos teus gestos apenas conjecturas, sombras
muros e regressos - nem sequer feridas
ou ruínas. E , ainda assim, sem eu saber porquê,
as ondas ameaçam o lago dos meus olhos.
 
 
Maria do Rosario Pedreira 
 





quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Florbela espanca

O teu segredo
O mundo diz-te alegre porque o riso
Desabrocha em tua boca, docemente
Como uma flor de luz! Meigo sorriso
Que na tua boca poisa alegremente!
Chama-te o mundo alegre. Ai, meu amor,
Só eu inda li bem nessa alegria!…
Também parece alegre a triste cor
Do sol, à tarde, ao despedir-se o dia!…
És triste; eu sei. Toda suavidade
Tão roxa, como é roxa uma saudade
É a tua alma, amor, cheia de mágoa.
Eu sei que és triste, sei. O meu olhar
Descobriu o segredo, que a cantar
Repoisa nos teus olhos rasos d’água!…


Florbela Espanca in Trocoando olhares
Art: Heidi Maier

 

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Fernando Campos de Castro //// Breve....


Era de noite e crescias
como um terraço de vento
clandestino ao desejo
E, súbito, acontecias
enquanto em fogo te abrias
à nudez fresca de um beijo
Morrer na tua boca
sem aviso prévio
ou condição nenhuma
É naufragar na luz
subterrânea e breve
de dois corpos entregues
numa orgia de espuma


Fernando Campos de Castro
(in Inquietudes e outras Atitudes)


segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Luadiurna ///// Há....

 
Há  palavras costuradas dentro do coração
com finíssimos fios de seda
é lá que se guardam  os sentimentos que na alma
afloram  repartidos na verdade do sentir
Há palavras que se (res)guardam por serem direitas e limpas
como direitos e limpos são os caminhos percorridos
são palavras ao rubro que escorrem pelos dedos da noite
onde o toque das estrelas ilumina o universo de quem espera
p`la manhã radiosa onde o sol é o abraço que aquece e reconforta
é o teu sorriso que aquece os dias vulgares
e é o teu nome escrito no horizonte.

Lua Diurna




Sebastião da Gama //// Pequeno poema

Quando eu nasci,
ficou tudo como estava.
Nem homens cortaram veias,
nem o Sol escureceu,
nem houve estrelas a mais...
Somente,
esquecida das dores,
a minha Mãe sorriu e agradeceu.
Quando eu nasci,
não houve nada de novo
senão eu.
As nuvens não se espantaram,
não enlouqueceu ninguém...
Pra que o dia fosse enorme,
bastava
toda a ternura que olhava
nos olhos de minha Mãe...


Sebastião da Gama, in 'Antologia Poética'
Tema(s): Mãe
 

SÃO REIS

 
Incondicional forma de amar essa
que nos faz esquecer de nós
e só pensar no outro
que nos faz despir o corpo
e oferecer a alma
que nos faz dar tudo a alguém
e querer o seu bem
mesmo que no fundo de nós saibamos
que aquilo que temos
nunca é aquilo que esperamos!

são reis 











António Ramos Rosa //// Momento....


O papel, a mesa, o sol, a pena...
Ao lado, a janela. E nada tenho
e nada sou que escrevo. E nada espero
de quanto espero.
Enquanto escrevo não sou nem mesmo quero
não escuto nem palavras nem silêncio.
Alinho palavras mas ainda não caminho.
Estou a uma mesa pobre sem movimento.
O papel, a mesa, o sol, a pena...
Nada começa, nem à sombra respiro.
Tudo é distinto e claro.
Tudo é certo ou obscuro. Eu não sou
neste intervalo. Em vão caminho.
Não quero esperar,
não quero navegar num mar fácil de palavras.
Quero caminhar somente com o corpo que sou,
quero, sem querer, ser o próprio sangue,
músculos, língua, braços, pernas, sexo,
a mesma certeza oculta e única, tantas vezes clara,
a mesma força que nos pulsos aflora, tensa,
a mesma noite aberta que a todo o dia estendo,
a mesma alta, elástica dança de um corpo vivo!
Mas agora estou no intervalo em que
toda a sombra é fria e todo o sangue é pobre.
Escrevo para não viver sem espaço,
para que o corpo não morra na sombra fria.
Sou a pobreza ilimitada de uma página.
Sou um campo abandonado. A margem
sem respiração.
Mas o corpo jamais cessa, o corpo sabe
a ciência certa da navegação no espaço,
o corpo abre-se ao dia, circula no próprio dia,
o corpo pode vencer a fria sombra do dia.
Todas as palavras se iluminam
ao lume certo do corpo que se despe,
todas as palavras ficam nuas
na tua sombra ardente.

António Ramos Rosa 




domingo, 7 de dezembro de 2014

RUI AMARAL MENDES




Por fim ouço a voz dos búzios,
Revelando-me a natureza imensa
Do mar que nos aparta;
Surdo a tudo o resto,
Entrego o meu grito
À noite e ao meu descontentamento
Orfãos raivosos de ti

Mas dispostos a receber até a côdea da tua sombra.
 
RUI AMARAL MENDES
 

são reis //// Até ao final.....

 
Até ao fim
hei-de gritar o teu nome
até ao ultimo grito
hei-de trazer-te ao peito
ainda que alguma luz estranha
me percorra o olhar
Até ao fim
hei-de invocar as borboletas
o cheiro a madressilvas
hei-de dançar descalça
e gritar às nuvens
Até ao fim
hei-de ser essa alma selvagem
que não se dobra nem conforma
esses braços perfumados
que te aguardam
a boca a ansiar pelo beijo
os lábios carmim expectantes
Até ao fim
hei-de ser esse contrasenso
esse medo inaudível
essa lembrança credível
de quem viveu sem o saber
Até ao fim
hei-de querer-te como ontem
como agora e como amanhã
como todos os dias
como todas as fogueiras
que ardem até às cinzas
Até ao fim
hei_de soprar-te borboletas
e azuis de céus que nunca toquei
hei-de chover sobre ti e orvalhar-te
Até ao fim hei-de ainda amar-te
e hei-de ser tu e tu
e tu mais eu!...
 
são reis
6dez14

ATÉ AO FINAL    Até ao fim  hei-de gritar o teu nome  até ao ultimo grito  hei-de trazer-te ao peito  ainda que alguma luz estranha  me percorra o olhar    Até ao fim  hei-de invocar as borboletas  o cheiro a madressilvas  hei-de dançar descalça  e gritar às nuvens    Até ao fim  hei-de ser essa alma selvagem  que não se dobra nem conforma  esses braços perfumados  que te aguardam  a boca a ansiar pelo beijo  os lábios carmim expectantes    Até ao fim  hei-de ser esse contrasenso  esse medo inaudível  essa lembrança credível  de quem viveu sem o saber    Até ao fim  hei-de querer-te como ontem  como agora e como amanhã  como todos os dias  como todas as fogueiras  que ardem até às cinzas    Até ao fim  hei_de soprar-te borboletas  e azuis de céus que nunca toquei  hei-de chover sobre ti e orvalhar-te  Até ao fim hei-de ainda amar-te  e hei-de ser tu e tu  e tu mais eu!...    são reis  6dez14

sábado, 6 de dezembro de 2014

Gardel, o inigualável

 
 
Agora,

que os velhos tempos já não voltarão mais,

restaram os cabarés silenciosos e as damas tristes,

testemunhas que foram dos teus palcos prediletos,

quando encantavas Buenos Aires
com canções doces e milongas sentimentais

que inundavam os corações de poesia

e faziam os casais dançarem enlevados

com a paixão nos sangues acelerados
pela beleza da música e dos desejos despertados.
 
Agora

só restam essas noites vazias,

em que me emborracho,

atrás da beleza que já não há,

em que tento, em vão, tanto buscar;

sabendo que sem ti
o tango jamais será o mesmo

embora o teu nome persista
em cada par que na pista
reviva esta magia que só o tango tem

e que só tu, Carlos Gardel,

como ninguém, 
 fizeste inigualável.
 
 
 
 
 
 

Cecília Meireles

Eis...
Aqui está minha vida - esta areia tão clara
com desenhos de andar dedicados ao vento.
Aqui está minha voz - esta concha vazia,
sombra de som curtindo o seu próprio lamento.
Aqui está minha dor - este coral quebrado
sobrevivendo ao seu patético momento.
Aqui está minha herança - este mar solitário
que de um lado era amor e, do outro, esquecimento.

Cecília Meireles  

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Maria Helena Guimarães //// NATAL

 
 
Natal

de sonhos e esperança,

de azevinho,

decorações multicores,

o calor de um carinho

em meu coração

de criança.

O lume de uma lareira,

o calor na minha alma,

chama de sonho que guardo,

esperança que ilumina,

preenche
o dia a dia

de uma doce fantasia.

Tua amizade,

um carinho,

é o presente que quero

no Natal


no sapatinho. 

De : Helena Guimaraes   NATAL


NOTA : 
                Desejo a todos/as  que visitam este blog  e aos que comentam

                UM SANTO E FELIZ NATAL



quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Joaquim Pessoa, in 'Guardar o Fogo'



 


Há pequenas aves que têm raízes nas palavras,
essas palavras que não ficam arrumadas com decência

na literatura,

palavras de amantes sem amor, gente que sofre

e a quem falta o ar quando faltam as palavras.

Quando digo o teu nome há uma ave que levanta voo

como se tivesse nascido o dia e uma brisa

encarcerada nas amêndoas se soltasse para a impelir

para o mais frio, para o mais alto, para o mais azul.

Quando volto para casa o teu nome vai comigo

e ao mesmo tempo espera-me já

numa casa construída com dois nomes,

como se tivesse duas frentes,

uma para a montanha e outra para o mar.

Por vezes dou-te o meu nome e fico com o teu,

espreito então pelas janelas de onde

se vêem coisas que nunca antes tinha visto,

coisas que adivinhava mas que não sabia,

coisas que sempre soube mas que nunca quis olhar.

Nessas alturas o meu nome é o teu olhar,

e os meus olhos são justamente a pronúncia do

teu nome que se diz com um pequeno brilho molhado,

um som pequeno como um roçagar de asas

dessas aves que constroem o ninho na folhagem da fala

e criam raízes fundas nas palavras vulgares

que os vulgares amantes engrandecem

quando falam de amor.


Joaquim Pessoa, in 'Guardar o Fogo'