Constatação
[...]
A noite desce já com seus cuidados
e connosco nossos máximos inimigos
não tardamos a ver-nos confrontados
E eis que sei que irremediavelmente
te perdi sem te ter encontrado
sem haver esgotado o mundo pressentido
no fundo da figura de mulher
que só se atravessou no meu caminho quando já tinha apenas para dar-lhe
o que de tão profundo em mim havia
que subsistia para além da instituição
incompatível com o verdadeiro amor
Destino? Fatalismo? Não sei bem
Eu sinto-me culpado porque todos temos decerto culpa em qualquer caso
E não vejo nisto espírito cristão
mas a simples constatação de que afinal
era em parte nossa a mão que se movia
Que venha a noite com os seus prodígios
Sinto que sou maior do que mim mesmo
que vou ter dimensões que só terei
quando morrer e que hei-de até dizer
palavras de pureza pavorosa
Não tenho nada a ver com toda a gente
Eu vi-te e só por ver-te tive em ti
mais do que até teria se tivesse renascido
Eras mulher a única mulher
e indefeso a ti me confiei
para me convencer de que sentia
seja o que for quando afinal não sinto
nada por mim nem por ninguém fora de ti
Para continuar precisaria de ter fé
e eu só acredito já naquilo que é
[...]
Ruy Belo
1 comentário:
Não tenho nada a ver com toda a gente
Eu vi-te e só por ver-te tive em ti
mais do que até teria se tivesse renascido
bjinho,Conde
Enviar um comentário