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terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Castro Alves /// Horas de Saudade



Horas de Saudade



Tudo vem me lembrar que tu fugiste,
Tudo que me rodeia de ti fala.

Inda a almofada, em que pousaste a fronte
O teu perfume predileto exala

No piano saudoso, à tua espera,
Dormem sono de morte as harmonias.

E a valsa entreaberta mostra a frase
A doce frase qu'inda há pouco lias.

As horas passam longas, sonolentas...
Desce a tarde no carro vaporoso...

D'Ave-Maria o sino, que soluça,
É por ti que soluça mais queixoso.

E não vens te sentar perto, bem perto
Nem derramas ao vento da tardinha,

A caçoula de notas rutilantes
Que tua alma entornava sobre a minha.

E, quando uma tristeza irresistível
Mais fundo cava-me um abismo n'alma,

Como a harpa de Davi teu riso santo
Meu acerbo sofrer já não acalma.

É que tudo me lembra que fugiste.
Tudo que me rodeia de ti fala...

Como o cristal da essência do oriente
Mesmo vazio a sândalo trescala.

No ramo curvo o ninho abandonado
Relembra o pipilar do passarinho.

Foi-se a festa de amores e de afagos...
Eras ave do céu... minh'alma o ninho!

Por onde trilhas um perfume expande-se
Há ritmo e cadência no teu passo!

És como a estrela, que transpondo as sombras,
Deixa um rastro de luz no azul do espaço...

E teu rastro de amor guarda minh'alma,
Estrela que fugiste aos meus anelos!

Que levaste-me a vida entrelaçada
Na sombra sideral de teus cabelos!...




Castro Alves

1 comentário:

disse...

Tudo que me rodeia de ti fala...
Amor, Amor sem dúvida tudo o que sublime no amor está transcrito neste poema.

Uma maravilha.
Beijooooooooooooo

LI