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sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Almada Negreiros Encontro







Que vens contar-me 
se não sei ouvir senão o silêncio? 

Estou parado no mundo. 

Só sei escutar de longe 
antigamente ou lá para o futuro. 

É bem certo que existo: 
chegou-me a vez de escutar. 

Que queres que te diga 
se não sei nada e desaprendo? 

A minha paz é ignorar. 

Aprendo a não saber: 
que a ciência aprenda comigo 
já que não soube ensinar. 

O meu alimento é o silêncio do mundo 
que fica no alto das montanhas 
e não desce à cidade 
e sobe às nuvens que andam à procura de forma 
antes de desaparecer. 

Para que queres que te apareça 
se me agrada não ter horas a toda a hora? 

A preguiça do céu entrou comigo 
e prescindo da realidade como ela prescinde de mim. 

Para que me lastimas 
se este é o meu auge?! 

Eu tive a dita de me terem roubado tudo 
menos a minha torre de marfim. 

Jamais os invasores levaram consigo as nossas 
torres de marfim. 

Levaram-me o orgulho todo 
deixaram-me a memória envenenada 
e intacta a torre de marfim. 

Só não sei que faça da porta da torre 
que dá para donde vim. 



Almada Negreiros

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