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sábado, 11 de março de 2017

António Sem










A NOITE TEM O TEU PERFUME





Onde tudo acaba tu começas. Os dias caem dentro dos dias. Vivo comigo no silêncio do tudo com escassos momentos de sol que me aquecem. São divisões da alma a fecharem-se e passeio pelo corredor da memória. Em silêncio, sozinho, mergulho no cíclico pensamento dos dias e das noites com lágrimas cristalinas ocultas a esperar que o doce sono de te ter ilumine o que o destino me entregou um dia. Repousas no limbo do meu corpo. Sei que agora só há ruinas... no termo do beco da minha vida e continuo a correr para para ti até que os braços se me partem de encontro ao muro espesso da ausência. Sei de um tempo que criámos para a frente e para trás de nós. Encheu-nos as memórias depois de sermos. Dos beijos que demos e não demos, do sexo na ponta do verbo, palavras nos dentes, sílabas doidas, o som dos nossos corpos a desabarem um no outro. A sede de ti assola cada momento perdido. O teu peito abrasa os dedos que repouso sobre o gume das arestas até à embriaguez. E eu gosto dos olhos com olhos de me desejar. Eu que circulo pelas tuas veias sedosas com sístoles de amor e desejo. Pelas noites sem ti o meu lençol rasgado chora de mágoa. Do outro lado do espelho a tua imagem santifica o tempo. Na contínua descoberta de mim próprio entrego-te os meus segredos e todos os itens do coração. Tornei-me poeta de ti. Êxtases, beijos compartilhados, carícias desnudadas, tempos de voz, ausências doloridas, adversidades sentimentais. E tudo isso é a amálgama da minha paixão e o desequilíbrio do amor. Agora vou para a cama e chegar-me a ti. Tu de um lado e eu de outro, vamos e vimos protegidos por um verbo único que é um segredo nosso. Daqui vejo-te e sossego. Estás sempre comigo na palavra e na cor. Abre o teu sono e deixa que a minha loucura se deposite em ti.
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©António Sem 2016    




Foto de Antonio Maria.

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