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quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Pablo Neruda //// Nocturno.....


Esta noite posso escrever os versos mais tristes.
Escrever, por exemplo: "A noite está estrelada,
e tiritam, azuis, os astros ao longe."
O vento nocturno rodopia no céu e canta.
Esta noite posso escrever os versos mais tristes.
Eu amei-a, e por vezes ela amou-me também.
Em noites como esta eu tive-a nos braços.
Beijei-a tantas vezes sob o céu infinito.
Ela amou-me, e por vezes eu a amei também.
Como podia não amar os seus grandes olhos fixos.
Esta noite posso escrever os versos mais tristes.
Pensar que não a tenho. Sentir que a perdi.
Ouvir a noite imensa, mais imensa sem ela.
E o verso cai na alma como no pasto o orvalho.
Que importa que o meu amor não a pudesse guardar.
Tantas estrelas no céu, e ela não está comigo.
É tudo. Ao longe alguém canta. Ao longe.
A minha alma não se conforma com tê-la perdido. 
Como para a aproximar o meu olhar procura-a.
O meu coração procura-a, e ela não está comigo.
A mesma noite que embranquece as mesmas árvores.
Nós dois, os de então, já não somos os mesmos.
Já não a amo, é verdade, mas amei-a tanto.
A minha voz buscava o vento para tocar o seu ouvido.
De outro. Será de outro. Como antes dos meus beijos.
A sua voz, o seu corpo claro. Os seus olhos infinitos.
Já não a amo, é certo, mas talvez a ame
É tão breve o amor, e tão longo o olvido.
Porque em noites como esta a tive nos braços,
a minha alma não se conforma com tê-la perdido.
Ainda que seja esta a última dor que ela me causa,
e sejam estes os últimos versos que lhe escrevo.

Pablo Neruda   

 




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