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sexta-feira, 8 de setembro de 2017

Nuno Júdice





























Ergo os dedos que ardem na noite,
e ilumino com eles as florestas aéreas
do esquecimento. De cada ramo nascem
rostos, como frutos, e colho dos seus lábios
as histórias que ouvi numa infância
de pálpebras espantadas. Procuro a obscuridade,
e tiro da sua geografia de segredos o caminho 
para ti: a criança que adormeceu sem saber
que o sonho a habitava.

Agora sei de onde vem o ruído
que assombra a noite. Por vezes, é o vento
que empurra as portas que ninguém fechou;
ou então, é o pássaro perdido que não encontra
a saída por entre telhas, nesta casa há muito
desabitada. E quando atravesso as salas
vazias, corres à minha frente, a sombra que
não puxei para mim numa antiga indecisão
de frases melancólicas.

Um silêncio clama a recompensa
de um calor intenso como a palavra que nele
ficou, até hoje, quando a tiro de dentro das cinzas
e  limpo de inúteis significados, para que
só o amor lhe dê a forma exacta como
a pedra deste canto, e a transforme num som
transparente como a água, abstracto como o ar,
musical como a voz de onde nasceu.



Nuno Júdice

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