tranquilidade
Ter esta chuva mansa
a palpitar pelas ruas como
metrónomo que denunciasse
os recursos imperceptíveis
com que dentro de mim
se vai reeditando
a tua presença
Ludibriar a congestão dos dias
com um assomo de dança,
duas ou três árvores
electrificadas pelo coração distante,
a transfiguração de uma época
esbanjada na pedra dos cemitérios,
todo o cansaço ilegalizado
por um músculo mais amplo,
tecido inquebrável
desta minha natureza
de teu
Porque o que esse olhar me traz ainda
apesar do grande pulmão de fuligem
que se interpôs no nosso voo
é a esperança numa esquina
assaltada pelo ferro
de uma antiga ternura
da qual não sobrou religião,
meramente esta alameda
de poemas mais ou menos assinados
com que homens e mulheres
vão desmanchando
- será? -
a vileza dos séculos
Quero agora concluir
as horas derradeiras desta espera
com uma inclinação de varanda,
puxar de toda a roupa que trago
e estender-me aos pingos insistentes
que anunciam os teus pés,
enxertar um tempo mais conseguido
no sangue, na recusa
da morte branda,
e ficar deste modo,
sem exagero de água,
a precipitar para a rua
a mão que, nadando na treva,
escavaste em mim
Vasco Gato
1 comentário:
Tranquilidade, um SE no meio do riso ou do choro, uma porta de vaivém que ao oscilar deixa entrar tanto vento quanto aquele que sai !!!... <3
BJ Conde <3
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