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terça-feira, 30 de abril de 2013
De : David Mourão Ferreira
Só tu a cada instante nos declaras
que renegas a voz de quem divide
Que a única verdade é haver almas
terrível impostura haver países
Que tanto tens das aves o desgarre
como o expectante frémito do tigre
tanto o céu indiviso que há nas águas
quanto o múltiplo fogo que há no trigo
Que és igual e diversa em toda a parte
Que és do próprio Universo o que o sublima
Que nasces que te apagas que renasces
em procura da límpida medida
Que reges o mais puro e o mais alto
do que Deus concedeu às nossas vidas
domingo, 28 de abril de 2013
Pablo Neruda // Quero-te Apenas Porque a Ti Eu Quero
Não te quero senão porque te quero
e de querer-te a não querer-te chego
e de esperar-te quando não te espero
passa meu coração do frio ao fogo.
Quero-te apenas porque a ti eu quero,
a ti odeio sem fim e, odiando-te, te suplico,
e a medida do meu amor viajante
é não ver-te e amar-te como um cego.
Consumirá talvez a luz de Janeiro,
o seu raio cruel, meu coração inteiro,
roubando-me a chave do sossego.
Nesta história apenas eu morro
e morrerei de amor porque te quero,
porque te quero, amor, a sangue e fogo.
Pablo Neruda, in "Cem Sonetos de Amor"
sábado, 27 de abril de 2013
Manuel de Sepulveda /// Gostar de ti
Tudo começou com o teu jeito,
E aquele trejeito
Meio desdenhoso meio atrevido,
de uma mulher
Que já tinha o Mundo decidido,
E sabe claramente
O que quer e o que não quer….
Depois... Continuou na tua maneira
Feita de ternura quando me procuras…
De suavidade quando te entregas...
- Mesmo quando te negas -
De doçura… e de amizade...
Ou feita do riso e brincadeira
a que nos damos,
Quando sozinhos nos amamos…
Mas foi nos teus olhos abertos...
muito perto,
Quando me interrogavas deste
segredo novo,
Agora descoberto,
Que neles eu li,
O que nunca encontrei
Em outras vidas que vivi !…
Manuel de Sepulveda
Alexandre O'Neill //// Um Carnaval
Vem ao baile vem ao baile
Pelo braço ou pelo nariz
Vem ao baile vem ao baile
E vais ver como te ris
Deixa a tristeza roer
As unhas de desespero
Deixa a verdade e o erro
Deixa tudo vem beber
Vem ao baile das palavras
Que se beijam desenlaçam
Palavras que ficam passam
Como a chuva nas vidraças
Vem ao baile, oh tens que vir
E perder-te nos espelhos
Há outros muito mais velhos
Que ainda sabem sorrir
Vem ao baile da loucura
Vem desfazer-te do corpo
E quando caires de borco
A tua alma é mais pura
Vem ao baile vem ao baile
Pelo chão ou pelo ar
Vem ao baile baile baile
E vais ver o que é bailar.
Alexandre O'Neill
sexta-feira, 26 de abril de 2013
quinta-feira, 25 de abril de 2013
Eugénio de Andrade /// Não canto porque sonho
Não canto porque sonho.
Canto porque és real.
Canto o teu olhar maduro,
O teu sorriso puro,
A tua graça animal.
Canto porque sou homem.
Se não cantasse seria
somente um bicho sadio
embriagado na alegria
da tua vinha sem vinha.
Canto porque o amor apetece.
Porque o feno amadurece
nos teus braços deslumbrados.
Porque o meu corpo estremece
Por vê-los nus e suados.
Eugénio de Andrade
25 de Abril /////// DIA DA LIBERDADE
25 de Abril
Esta é a madrugada que eu esperava
o dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo.
Sophia de Mello Breyner Andresen
quarta-feira, 24 de abril de 2013
Amor /// Manuel Rui ( Poeta Angolano )
Assim de espuma e sal teu corpo a navegar
num meio-dia a onda e sol liberto
na conseguida fúria de estar perto
dia após dia para lá do mar.
assim nossa conquista de criar
na incerteza o que fazemos certo
um sol todos os dias mais desperto
dia após dia para lá do mar.
assim na fúria de saber amar
palavras poucas de um viver inquieto
nas noites esquecidas de luar.
assim como uma onda sempre a transformar
o amanhã numa manhã de afecto
dia após dia para lá do mar
terça-feira, 23 de abril de 2013
Fernando Pessoa // Eros e Psique
Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada
Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.
A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera,
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.
Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado,
Ele dela é ignorado,
Ela para ele é ninguém.
Mas cada um cumpre o Destino —
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.
E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora,
E, inda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.
Fernando Pessoa
Jorge de Sena // Denúncia
Sonharei, no teu seio calmo,
O sonho invisível do cego de nascença.
Dormirei, no teu cerrar de pálpebras,
Como um peixe desliza entre os ramos de árvore
Reflectidos na água.
Dormirei, nas tuas mãos pousadas no meu corpo,
O desejo de te acariciar sem perigo
- não vá tirar-te escamas, borboleta presa.
Dormirei, no teu sexo, a solidão do meu
Ao existir para que eu pense em ti.
Dormirei, na tua vida, a teimosia humana
De um sentido universal para as coisas connosco.
E se, depois, meu amor, formos estéreis,
Se a demora do tempo tiver tido um gesto abandonado,
E a morte, à nossa volta, um moleiro sem trigo,
O mundo que vier inveja-nos
E o nosso espírito há-de perdoar-nos.
Jorge de Sena
segunda-feira, 22 de abril de 2013
Para te amar.....// Pedro Homem de Mello
Pedro Homem de Mello
Para te amar ensaiei os meus lábios...
Deixei de pronunciar palavras duras.
Para te amar ensaiei os meus lábios!
Para tocar-te ensaiei os meus dedos...
Banhei-os na água límpida das fontes.
Para tocar-te ensaiei os meus dedos!
Para te ouvir ensaiei meus ouvidos!
Pus-me a escutar as vozes do silêncio...
Para te ouvir ensaiei meus ouvidos!
E a vida foi passando, foi passando...
E, à força de esperar a tua vinda,
De cada braço fiz mudo cipreste.
A vida foi passando, foi passando...
E nunca mais vieste!
srsrsrsrsrsrsrsrsr
domingo, 21 de abril de 2013
Espelhos Sandra Subtil
Não me julgues pelo sorriso tímido
Há em mim uma força desmedida
(escondida)
Não me julgues pelo olhar frágil
Há em mim uma batalha constante
(oculta)
Não me julgues pelo andar pesado
Há em mim a leveza das nuvens
(disfarçada)
Não me julgues pelo corpo disforme
Há em mim a delicadeza das flores
(adormecida)
Não me julgues pelas palavras tristes
Há em mim uma alegria de vida
( contida)
Nada é o que parece.
Ninguém é o que se vê.
Atrás dos espelhos há sempre essência por revelar
Que por medo, cobardia, vergonha
ou pela simples condição humana
Vive hibernada à espera do sol chegar.
Cascata // Isabel Solano
Dos teus dedos, quando tocam teclas de água,
Escorre um rio que lava as minhas lágrimas
E me devolve os sonhos que quis ter um dia
Presentes, vivos, num rodopio tonto de euforia
Dos teus dedos, quando acordam calmarias,
Desprendem-se em cascata todas as fantasias
E rolam revoltas as minhas ideias – tão soltas –
Por entre os seixos dóceis e os juncos complacentes
Nos teus dedos me perco e encontro o curso fluido
Transparente, da minha alma que pensava ausente
in Sem nós na garganta, inédito, 2009.
sábado, 20 de abril de 2013
És(me): tudo em tudo DANIELA S. PEREIRA
Semicerro os olhos
E vejo-te:
Na brisa suave
Que me afaga o rosto,
No brilho da Lua
Que me penetra a pele
E no aroma
Que me invade os sentidos...
Sinto-te:
No abraço
Do mar à terra,
No voo
Das gaivotas no céu
E no suave toque
Da areia dourada...
És(me): tudo em tudo
Na pele, um toque de veludo
E o sol que me aquece o coração...
in COM ALMA & OLHAR (Edium Ed., 2012)
sexta-feira, 19 de abril de 2013
De : São Reis
E embora nem sempre os meus olhos cruzassem os teus
eu sabia-te lá
tão perto e tão longe
como um vício que se quer deixar
mas que nos sacode de tanta vontade
eu sabia-te lá
bem debaixo da minha pele
o teu perfume passando rente às minhas narinas
e era como se sentisse a tua boca
aflorando a minha
E embora eu desviasse o olhar
eu sabia que tinhas os olhos cravados em mim
..porque é impossivel desviar o olhar
daquilo que se quer...
são reis
eu sabia-te lá
tão perto e tão longe
como um vício que se quer deixar
mas que nos sacode de tanta vontade
eu sabia-te lá
bem debaixo da minha pele
o teu perfume passando rente às minhas narinas
e era como se sentisse a tua boca
aflorando a minha
E embora eu desviasse o olhar
eu sabia que tinhas os olhos cravados em mim
..porque é impossivel desviar o olhar
daquilo que se quer...
são reis
quarta-feira, 17 de abril de 2013
JOAQUIM PESSOA, POEMA PRIMEIRO
Gosto-te. E desta certeza
se abre a manhã como uma imensa
rosa de desejo indestrutível. O futuro
é o próximo minuto, para além
da infatigável religião dos meus versos,
em cuja luz me acendo, feliz e nu.
O meu sorriso conhece a bondade
dos animais, o poder frágil das corolas,
e repete o nome feminino dos arcanjos de
peitos redondos, perfumados
pelas giestas dos caminhos
do céu.
Gosto-te. Amarrado
pelos meus braços de beduíno do sol,
pobre senhor dos desertos,
profeta da distância que há dentro das palavras,
onde se alongam sombras
e o sofrimento se estende até à orla
da mais inquieta serenidade.
Gosto-te. E tenho sido
feliz, por nunca ter seguido os trilhos
que me quiseram destinar. Aqui
e ali me pergunto, despudoradamente. E sei
que não sei mentir. É por isso,
que recolho na face a luz imprescindível
ao orgulho dos peixes
e dos frutos.
Gosto-te. Na-na-na, na-ô...
Na-na-na, na-ô... na-nô...
Canta o espírito do caminho,
canta para mim e canta para ti, eleva
o coração das grandes árvores, coração
de seiva e de coragem,
sangue fresco e verde, apaixonado
e doce,
de tanto contemplar o perfil das tardes.
Gosto-te. Mas "longe"
é uma palavra húmida, grávida,
onde os sinos da erva tocam
para convocar as sílabas. E,
ao procurar-te, tremo apenas
de ternura
para que nem mesmo a inteligente brisa
da manhã
possa dar por mim.
Mais discreto que isto
é impossível.
in GUARDAR O FOGO ( Livro em preparação, 43 inéditos e uma antologia)
Imagem: Mark Arian, in Tutt'Art@
E . E . Cummings // Nalgum lugar me que eu nunca estive
nalgum lugar em que eu nunca estive, alegremente além
de qualquer experiência, teus olhos têm o seu silêncio:
no teu gesto mais frágil há coisas que me encerram,
ou que eu não ouso tocar porque estão demasiado perto
teu mais ligeiro olhar facilmente me descerra
embora eu tenha me fechado como dedos, nalgum lugar
me abres sempre pétala por pétala como a primavera abre
(tocando sutilmente, misteriosamente) a sua primeira rosa
ou se quiseres me ver fechado, eu e
minha vida nos fecharemos belamente, de repente,
assim como o coração desta flor imagina
a neve cuidadosamente descendo em toda a parte;
nada que eu possa perceber neste universo iguala
o poder de tua imensa fragilidade: cuja textura
compele-me com a cor de seus continentes,
restituindo a morte e o sempre cada vez que respira
(não sei dizer o que há em ti que fecha
e abre; só uma parte de mim compreende que a
voz dos teus olhos é mais profunda que todas as rosas)
ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas
terça-feira, 16 de abril de 2013
De : São Reis
Ter a infinita paciência de apreciar
um nascer de dia
Agradecer por se estar vivo
Bendizer a natureza
apreciar as pessoas
as coisas
mesmo o que parece insignificante
Aceitar...sempre!
E se não se aceitar, transformar!...
Transformar o simples
mas tendo o cuidado de não estragar...
porque a beleza de tudo
das pessoas e das coisas
está precisamente nessa simplicidade de ser
de aceitar aquilo que vem...
..da forma como vem...!
são reis
Ilustração: Nascer do Sol , em foto tirada do Miradouro « Ponta da Madrugada » Ilha de São Miguel Açores
um nascer de dia
Agradecer por se estar vivo
Bendizer a natureza
apreciar as pessoas
as coisas
mesmo o que parece insignificante
Aceitar...sempre!
E se não se aceitar, transformar!...
Transformar o simples
mas tendo o cuidado de não estragar...
porque a beleza de tudo
das pessoas e das coisas
está precisamente nessa simplicidade de ser
de aceitar aquilo que vem...
..da forma como vem...!
são reis
Ilustração: Nascer do Sol , em foto tirada do Miradouro « Ponta da Madrugada » Ilha de São Miguel Açores
segunda-feira, 15 de abril de 2013
De : Maria do Rosário Pedreira
Esta manhã encontrei o teu nome nos meus sonhos
e o teu perfume a transpirar na minha pele. E o corpo
doeu-me onde antes os teus dedos foram aves
de verão e a tua boca deixou um rasto de canções.
No abrigo da noite, soubeste ser o vento na minha
camisola; e eu despi-a para ti, a dar-te um coração
que era o resto da vida - como um peixe respira
na rede mais exausta. Nem mesmo à despedida
foram os gestos contundentes: tudo o que vem de ti
é um poema. Contudo, ao acordar, a solidão sulcara
um vale nos cobertores e o meu corpo era de novo
um trilho abandonado na paisagem. Sentei-me na cama
e repeti devagar o teu nome, o nome dos meus sonhos;
mas as sílabas caíam no fim das palavras, a dor esgota
as forças, são frios os batentes nas portas da manhã.
De : Maria do Rosário Pedreira
Amei-te como na vida se ama uma só vez;
e todos os afetos que dividi depois eram
apenas cinzas que evocavam o brilho dessa
imensa chama. Troquei suspiros e beijos
com muitas outras bocas quando, na minha,
o travo da solidão era uma amarga desculpa
para repartir o pouco que não tinha; mas
em nenhuma quis morder fruto mais
suculento que o silêncio nem permiti que
pousasse sequer o meu nome verdadeiro -
que só nos teus lábios era graça e canção
e eco de loucura. Foi o meu corpo tão vão displicente
naqueles que o cingiram que me faria velha
a tentar recordar-lhes os gestos hesitantes,
as convulsões da pressa e os veios de sal que
descreviam no litoral da pele o aviso de uma
paisagem interior abandonada. Mas de nada
me serviu amar-te assim - pois, ao dizer-te o
que não pude ser longe de ti, digo-te o que sou
e isso há de guardar-te para sempre de voltares.
(Maria do Rosário Pedreira)
e todos os afetos que dividi depois eram
apenas cinzas que evocavam o brilho dessa
imensa chama. Troquei suspiros e beijos
com muitas outras bocas quando, na minha,
o travo da solidão era uma amarga desculpa
para repartir o pouco que não tinha; mas
em nenhuma quis morder fruto mais
suculento que o silêncio nem permiti que
pousasse sequer o meu nome verdadeiro -
que só nos teus lábios era graça e canção
e eco de loucura. Foi o meu corpo tão vão displicente
naqueles que o cingiram que me faria velha
a tentar recordar-lhes os gestos hesitantes,
as convulsões da pressa e os veios de sal que
descreviam no litoral da pele o aviso de uma
paisagem interior abandonada. Mas de nada
me serviu amar-te assim - pois, ao dizer-te o
que não pude ser longe de ti, digo-te o que sou
e isso há de guardar-te para sempre de voltares.
(Maria do Rosário Pedreira)
domingo, 14 de abril de 2013
De : Maria Helena Guimarães
Café Majestic - Porto
Fantasia. Maria Helena GuimarãesEstavam sentados à mesa de tampo de mármore do Majestic. Os cafés descansavam frios, esquecidos. Nas mãos a ânsia do afago. O olhar liquefeito de desejo.
Tudo começara por uma brincadeira na net:
- De onde tc?
Depois fora a fantasia….
E agora, no ambiente arte-nova do café da baixa, tentavam reorganizar na realidade os sentimentos…
Pelas portas de vidro a claridade entrava mansa. Na mesa do canto um homem rabiscava no guardanapo de papel. Algum poeta a beber o ambiente de tertúlia de outrora….
Lá fora, na rua, o homem- estátua, coberto de alvaiade, ausente na sua imobilidade, negava o frio e o vento por alguns cêntimos…..
- Vamos à Foz ver o sol pôr? – a voz dela quebrou o silêncio pesado do que não se quer dizer…
Os trocos tamborilaram na mesa, sobrepondo-se ao sussurrar quente do ambiente. Empurraram a porta e caminharam lado a lado pela rua empedrada que fazia doer os pés.
- Lembras-te do eléctrico? Aquele que fazia a marginal? – a pergunta dele atirou-os para a mocidade, dependurados do eléctrico, as bocas cheias de riso, o vento a esvoaçar os cabelos…
Mas já não havia. Agora um autocarro cheio de gente, suada e apressada, empurrando-se numa conquista do futuro, fazia o caminho em arranques e travagens que enrolavam o estômago.
Na Foz o pôr do sol de rio-mar era esplêndido. Sentaram-se na esplanada e beberam os raios vermelho sangue que caminhavam até eles nas ondas mansas.
Entrelaçaram as mãos na conjugação da poesia dos corpos e do rubro sol que se afundava no mar…lá ao longe, no cais, os pescadores, pacientemente, lançavam as linhas para apanhar robalos…
A noite tombou calma e sem pressa. Foram conversando sem pressa. Foram-se avaliando sem pressa…
Jantaram na Ribeira. Num restaurantezinho cavado na rocha onde, nas mesas de bancos corridos, o vinho tinto se bebia em canecas cheias de espuma e o cardápio se lia numa lousa espetada na parede.
Os olhos incendiavam o corpo. A fome era pouca.
O rio em maré vasa deslizava por entre os rebelos de exposição. Do outro lado as pequenas barracas nas esplanadas do vinho do Porto.
- Vamos beber um copo? – E atravessaram a ponte velha de ferro.
Da esplanada via-se o Porto. Ao longe o rio a beijar o mar. O casario amarelo subindo a encosta como um presépio. Uma calma feita de passado e recordações. Perto da barra, na colina, o Convento de Monchique onde Mariana de Alcoforado viu partir barra fora para as galés Simão Botelho, no apaixonado livro de Camilo “Amor de Perdição”
Os músicos tocavam anos sessenta….Compraram uma rosa vermelha que trazia no pé, enrolado, um poema de Florbela: Meus nervos, guizos de oiro a tilintar/cantam-me na alma a estranha sinfonia/ da volúpia, da mágoa e da alegria,/que me faz rir e que me faz chorar.
O vinho do Porto, dourado, macio e encorpado, aquecia-lhes o corpo e desprendia-lhes o sentimento…
Levantaram-se e enlaçados partiram pelas ruelas rumo à noite….
Maria Helena Guimarães
MAJESTIC – O café mais famoso do Porto e um dos mais belos do mundo. Conta a história do Porto da “Belle Epoque”, dos escritores e artistas, das tertúlias políticas e do debate de ideias. Obra do arqt. João Queirós, foi inaugurado em 1921. Amadeu de Sousa Cardoso, Teixeira de Pascoais e José Régio foram presenças constantes. Restaurado em 1994, manteve o seu traçado em arte-nova – tectos em gesso pintado de dourado e trabalhado, magníficos espelhos de cristal de Antuérpia nas paredes, chão de mármore indiano. Lustres de grandes dimensões dão uma luz difusa e as mesas têm tampos de mármore
De . Hamilton Afonso
Há coisas que não estão ao alcance
das minhas palavras dizer-te
Experimentarei fazê-lo
no calor do meu abraço
e no olhar-te olhos nos olhos
Então tomarás conhecimento
do quanto te amo, do quanto
te quero
, O Canto e as armas // Manuel Alegre
É possível falar sem um nó na garganta.
É possível amar sem que venham proibir.
É possível correr sem que seja a fugir.
Se tens vontade de cantar não tenhas medo: canta.
É possível andar sem olhar para o chão.
É possível viver sem que seja de rastos.
Os teus olhos nasceram para olhar os astros.
Se te apetece dizer não, grita comigo: não!
É possível viver de outro modo.
É possível transformar em arma a tua mão.
É possível viver o amor. É possível o pão.
É possível viver de pé.
Não te deixes murchar. Não deixes que te domem.
É possível viver sem fingir que se vive.
É possível ser homem.
É possível ser livre, livre, livre.
, O Canto e as armas
LETRA PARA UM HINO
sábado, 13 de abril de 2013
Não vou pôr-te flores de laranjeira no cabelo
Não vou pôr-te flores de laranjeira no cabelo
nem fazer explodir a madrugada nos teus olhos.
Eu quero apenas amar-te lentamente
como se todo o tempo fosse nosso
como se todo o tempo fosse pouco
como se nem sequer houvesse tempo.
Soltar os teus seios.
Despir as tuas ancas.
Apunhalar de amor o teu ventre.
Joaquim Pessoa
sexta-feira, 12 de abril de 2013
SE EU PUDESSE...// Manuel Sepúlveda
Se eu pudesse ...
Dava-te aquele momento de alegria
Que à Vida dá sentido....
Quando com excitação
E alguma loucura no coração
Acreditamos ter vencido
A solidão... e com ela a agonia
De viver, continuamente,
Como se a alma estivesse vazia...
Depois...
Devolvia-te a ti própria…
E de seguida,
Mesmo que mais não fizesse...
Havia de morrer contente
Com tua imagem de uma mulher feliz...
Sempre presente...
E eu...porque tanto quis
Que pelo menos um dia ...
Pudessemos estar juntos... os dois!
NOTA :
Se eu pudesse !...
Ah!...Como eu queria!...
quinta-feira, 11 de abril de 2013
MAR DE PALAVRAS // Sandra Subtil
Mastigo as palavras que me beijam, serenas, a face dos sonhos.
Há nelas aroma de almíscar e textura inusitada.
Deixo-me envolver no mar de sensações que brotam de cada brilho destrela,
de cada suspiro de fonte.
Naufraga de mim, não procuro a margem.
Por vezes urge afogar-se nas águas da emoção,
morrer na asfixia dos sentidos
para saber que somos gente,
temos coração
e estamos vivos.
Joaquim Pessoa // O Amor é...
Joaquim Pessoa
Portugal
n. 1948
Poeta
O amor é um pássaro. Uma armadilha. Uma fraqueza e uma força.
O amor é uma inquietação, uma esperança, uma certeza, uma dúvida. O amor dá-te asas, o amor derruba-te, o amor assusta-te, o amor promete-te, o amor vinga-te, o amor faz-te feliz.
O amor é um caos, o amor é uma ordem. O amor é um mágico. E um palhaço. E uma criança. O amor é um prisioneiro. E um guarda.
Uma sentença. O amor é um guerrilheiro. O amor comanda-te. O amor ordena-te. O amor rouba-te. O amor mata-te.
O amor lembra-te. O amor esquece-te. O amor respira-te. O amor sufoca-te. O amor é um sucesso. E um fracasso. Uma obsessão. Uma doença. O rasto de um cometa. Um buraco negro. Uma estrela. Um dia azul. Um dia de paz.
O amor é um pobre. Um pedinte. O amor é um rico. Um hipócrita, um santo. Um herói e um débil. O amor é um nome. É um corpo. Uma luz. Uma cruz. Uma dor. Uma cor. É a pele de um sorriso.
Joaquim Pessoa, in 'Ano Comum'
terça-feira, 9 de abril de 2013
Fátima Porto // É ASSIM....
É assim com esse olhar
Que te quero
Um olhar doce e meigo
De uma cor que nem sei definir
É assim neste pranto
Que meus olhos te vêm
E meu peito te sente
Mágoas de um amor ausente
É assim que me dou
No silêncio das noites sem ti
Que vejo teus olhos em mim
Num querer ainda maior
É assim nosso amor suave
Como nuvem que passa ligeira
Aquecido pelos raios d’um sol de verão
E regado com lágrimas por não poder gritar:
Nosso Amor é Assim!
Fátima Porto
Texto registado e protegido pelo IGAC
domingo, 7 de abril de 2013
Poema para uma Saudade /// Fernanda Guimarães
Tudo em mim és tu
Quando a solidão cala-me a voz
E o olhar debruça-se sobre o mistério
Onde o amor e o sonho
Sussurram-me o que tanto sei
Uma intuição de gestos flagra-me os segredos
Anunciando-te no horizonte da saudade
Em vão interroga-me a tarde morna
Enquanto os abraços aconchegam-me em lembranças
E apenas o silêncio responde a minha inquietação
Para além de mim
Onde se cruzam pensamentos e anseios
Volta-se o meu olhar
Como se pronunciasse o teu nome
Cobre-se o céu em vigília
Com o manto negro da noite
Como se também ele aguardasse
O som dos teus passos
Para iluminar todo o meu universo
sábado, 6 de abril de 2013
APETECE-ME // Fátima Porto
Teus beijos doces
Que embalam o repouso
Na vontade serena
De juntos estarmos
Em tão grande afeição
Olhares que percorrem
Caminhos secretos
E mãos que leem
O sentir dos corpos
No encaixe perfeito
Quero adormecer
Em teu abraço
E sentir no silêncio
O calor do amor
Suavemente sorrindo…
LÍLIA TAVARES, in PARTO COM OS VENTOS (a publicar em 2013) [HOJE ACORDEI COM A DOR DAS ÁRVORES]
Sophia de Mello Breyner Andresen.
Hoje acordei com a dor das árvores; estou de pé e o meu tronco sustém
o vazio e a solidão dos ramos
côncavos de espera,
impacientes de ternura.
Quero o bracejar dos pássaros,
ser refúgio dos ventos que me procuram,
tornar-me na folhagem que te abriga,
ser o ninho na tua noite, aberto
com a inquietação e a serenidade
dos rumores das aves mais tardias.
Não, desta vez não vou ...
sexta-feira, 5 de abril de 2013
Meus olhos verdes de João-Maria Nabais
Eu sonho acordado
muitas vezes sem dar por isso
olhando o infinito
através dos meus olhos verdes
nem sempre verdes é certo
às vezes azuis
outras cinzentos
variando durante o dia
conforme a intensidade da luz
do sol ou das estrelas
passando a verde se escuto
- o silêncio do mar longo e profundo
e o canto das cigarras
em noite cheia de lua
cinzento é um tempo de ninguém
vindo de fora sem prever
azul o rosto da manhã
de um instante de saudade escrito na memória
verde a força que deposito
no amor e me alimenta o coração
os meus olhos são verdes
azuis ou cinzentos ?
a mim pouco importa
aos outros também
verde é simplesmente
a cor do momento
- um símbolo de esperança
sortilégio de olhar
e ver o mundo
em mais um dia que vivo
e sinto
João-Maria Nabais
quinta-feira, 4 de abril de 2013
Quero-te para além das coisas justas
Quero-te para além das coisas justas
e dos dias cheios de grandeza.
A dor não tem significado quando ma roubam as árvores,
as ágatas, as águas.
O meu sol vem de dentro do teu corpo,
a tua voz respira a minha voz.
De quem são os ídolos, as culpas, as vírgulas
dos beijos? Discuto esta noite
apenas o pudor de preferir-te
entre as coisas vivasCamané - Sei de um rio //// FADO
NOTA :
COMO TENHO VISITAS DE EXPRESSÃO ESPANHOLA ; COLOCO
ESTE COMENTARIO NESSA MESMA LINGUA....
QUE ME DESCULPEM OS VISITANTES DO BRASIL E DE OUTROS
PAISES.
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NO IMPORTA EL IDIOMA PARA UN EXPRESAR UN SENTIMIENTO, EN CUAL QUIER LENGUA EL AMOR ES BELLO EXPRESARLO. BASTA DARLE LA FUERZA QUE SALE DEL CORAZON ENAMORADO PARA DARNOS CUENTA LA SENSACION DE LAS PALABRAS, QUE BELLO ES OIR ESTA MELODIA.
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FERNANDO TORDO // SOU DE OUTRAS COISAS
Sou de outras coisas
pertenço ao tempo que há-de vir sem ser futuro
e sou amante da profunda liberdade
sou parte inteira de uma vida vagabunda
sou evadido da tristeza e da ansiedade
Sou doutras coisas
fiz o meu barco com guitarras e com folhas
e com o vento fiz a vela que me leva
sou pescador de coisas belas, de emoções
sou a maré que sempre sobe e não sossega
Sou das pessoas que me querem e que eu amo
vivo com elas por saber quanto lhes quero
a minha casa é uma ilha é uma pedra
que me entregaram num abraço tão sincero
Sou doutras coisas
sou de pensar que a grandeza está no homem
porque é o homem o mais lindo continente
tanto me faz que a terra seja longa ou curta
tranco-me aqui por ser humano e por ser gente
Sou doutras coisas
sou de entender a dor alheia que é a minha
sou de quem parte com a mágoa de quem fica
mas também sou de querer sonhar o novo dia
in Álbum ANTICICLONE, 1984
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