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segunda-feira, 1 de abril de 2019

Fernando Campos de Castro






A NAVE DOS LOUCOS


Embarcamos sem destino pelo espaço inseguro
Tão juntos quão separados
lá vamos amotinados nesta nave do futuro
Fecharam - se as escotilhas
e temos sobre os artelhos os olhos dos seguranças
Na nave das maravilhas
não há lugar para os velhos
num espaço p `ra partilhas nem jardins para as crianças
O ar que aqui respiramos
condiciona os sentidos que trazemos baralhados
e na comida enlatada
dormem cancros e eczemas
que em doses muito pequenas
nos vão matando aos bocados
E quase a dois mil à hora lá vamos em velocidade
debitando cada hora na conta da humanidade
É nesta nave de loucos que embarcaram sem saber 
as gentes que nós sabemos
Prostitutas azeiteiros beatos  e paneleiros
e um refinado sacrista
que se afirma moralista
quando engata os seus parceiros
Mulheres 
crianças famintas e homens desempregados
aqui navegam todos
Aqui flutuam teses de certos Bispos solteiros
(  que inegável talento )
reunidos em Concílio sobre as leis do casamento
Aqui navegam ministros patrões criados doutores
e um poeta falhado que nunca se encontrou
Polícias ladrões artistas
palhaços contorcionistas
e duas velhas coristas de um teatro que fechou
Aqui levitam canudos de tantos jovens formados
que secaram os seus olhos
na miragem sem futuro de anúncios falsificados
E vão aqui alquimistas arquitectos e engenheiros
e vão certos cientistas 
que trabalham com afã com agulhas e ampulhetas
inventando nas provetas o homem do amanhã
E nesta nave de loucos 
pelo espaço inseguro
não somos muitos nem poucos
Somos loucos todos loucos
nesta nave do futuro.

Fernando Campos de Castro

Do livro "" Violação da Noite / Poemas, pags. 59/60







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