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sábado, 6 de maio de 2017

Nuno Júdice










É isto o amor

Em quem pensar, agora, senão em ti? Tu, que
me esvaziaste de coisas incertas, e trouxeste a
manhã da minha noite. É verdade que te podia
dizer: «Como é mais fácil deixar que as coisas
não mudem, sermos o que sempre fomos, mudarmos
apenas dentro de nós próprios?» Mas ensinaste-me
a sermos dois; e a ser contigo aquilo que sou,
até sermos um apenas no amor que nos une,
contra a solidão que nos divide. Mas é isto o amor:
ver-te mesmo quando te não vejo, ouvir a tua
voz que abre as fontes de todos os rios, mesmo
esse que mal corria quando por ele passámos,
subindo a margem em que descobri o sentido
de irmos contra o tempo, para ganhar o tempo
que o tempo nos rouba. Como gosto, meu amor,
de chegar antes de ti para te ver chegar: com
a surpresa dos teus cabelos, e o teu rosto de água
fresca que eu bebo, com esta sede que não passa. Tu:
a primavera luminosa da minha expectativa,
a mais certa certeza de que gosto de ti, como
gostas de mim, até ao fim do mundo que me deste. 



Nuno Júdice
in "Pedro, Lembrando Inês"



NOTA:  ... é seguramente dos poemas de amor de que mais gosto. talvez por isso tenha demorado mais tempo para trazê-lo aqui. nem sempre o melhor vem primeiro e se apanha primeiro. poucas vezes é assim, pensando mais. também demorei muito a escolher a foto. tinha imaginado um registo leve, talvez desfocado, e em preto e branco. fiz alguns ensaios. mas a bela coreografia da olga roriz não me saía da cabeça e acabou por vencer o resto... 





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