Uma das tragédias da nossa idade é a invasão do domínio pessoal por valores que pertencem apenas ao domínio social.
Assim, a liberdade, por exemplo, passou a ser um verdadeiro constrangimento do amor, da amizade. Certas noções de autonomia acabam por destruir a base profunda de uma relação humana séria e sentida: a lealdade. Não se pode querer amar e ser amado sem prescindir daquilo que se preza ser a "liberdade". A lealdade é um constrangimento que se aceita e que se cumpre em nome de algo (de alguém) que se julga (porque se ama) mais precioso que a liberdade. Quando se é independente não se pode depender de (confiar em) ninguém. Não querer ser livre, quando se ama, é não querer ficar sozinho. Se custa abdicar, sacrificar, pactuar, é esse o preço a pagar, por algo que vale muito mais: o valor raro, sem preço, de amar.
Miguel Esteves Cardoso
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