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terça-feira, 6 de junho de 2023

Nuno Júdice

 

JUN

Photo: Man Ray



"... uma jovem mulher com sua harpa de sombra..." 
Herberto Helder 

O movimento da mulher quando anda 
desenha-se no próprio ar, deixando um sulco que 
agita os ramos em que ainda sobram algumas 
flores. Posso compará-lo com um rasto de onda 
que rebentou, sobrando só essa espuma quase 
transparente que o sol atravessa; mas a mulher 
quando anda tem a densidade do mármore 
de uma antiga estátua, embora o seu corpo se 
molde à resistência do sol que, ao incidir na sua 
pele, solta os brilhos que ela afasta com os 
braços, em busca de sombra. É assim, digo, que 
o movimento da mulher quando anda transforma 
o seu corpo em aresta de luz, por entre as cores 
e as formas que o prendem, e de que as suas 
pernas se libertam quando saltam a vedação 
e pousam na terra, do outro lado, como harpa 
num instante de repouso.


Nuno Júdice

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