Seguidores

sexta-feira, 31 de maio de 2024

 

MAY



O amor era aquele quarto vazio, e de súbito 
cheio quando por ele entravas. Amontoavam-se 
as roupas quando te despias; pouco importava 
a luz que entrava pela janela, de persianas 
abertas, ou a breve luz de um candeeiro quando 
era noite, e o que eu via tinha a luz da tua pele. 

O amor, então, era esse livro que estava 
por abrir. Eram as folhas da árvore que o vento 
fazia roçar pelo vidro, e esse ruído acompanhava 
o roçar da mão pelo corpo. Eram aqueles pássaros 
que insistiam em cantar, como se a primavera 
durasse para sempre, e para sempre o amor durasse. 

Mas tudo tinha a eternidade daquele instante, 
e pela tua boca passavam as quatro estações 
do poema que me dizias. Não era preciso olhar 
para o relógio que não existia; nem saber de quem 
eram os passos que ouvi naquela hora, como se houvesse 
outros passos além dos teus, quando chegavas. 

Não fiz a conta a esses quartos, não sei já se era 
noite ou se era dia quando, para sempre, a porta se abria, 
não sei quantas vezes o livro ficou por fechar, nem 
que livro era esse que ainda está por abrir. Uma luz, 
apenas, vem dessa rua em que tantas vezes te via, 
e ainda ouço, no meu canto, o que o teu amor me dizia.


Nuno Júdice

Sem comentários: