MAY
O amor era aquele quarto vazio, e de súbito
cheio quando por ele entravas. Amontoavam-se
as roupas quando te despias; pouco importava
a luz que entrava pela janela, de persianas
abertas, ou a breve luz de um candeeiro quando
era noite, e o que eu via tinha a luz da tua pele.
O amor, então, era esse livro que estava
por abrir. Eram as folhas da árvore que o vento
fazia roçar pelo vidro, e esse ruído acompanhava
o roçar da mão pelo corpo. Eram aqueles pássaros
que insistiam em cantar, como se a primavera
durasse para sempre, e para sempre o amor durasse.
Mas tudo tinha a eternidade daquele instante,
e pela tua boca passavam as quatro estações
do poema que me dizias. Não era preciso olhar
para o relógio que não existia; nem saber de quem
eram os passos que ouvi naquela hora, como se houvesse
outros passos além dos teus, quando chegavas.
Não fiz a conta a esses quartos, não sei já se era
noite ou se era dia quando, para sempre, a porta se abria,
não sei quantas vezes o livro ficou por fechar, nem
que livro era esse que ainda está por abrir. Uma luz,
apenas, vem dessa rua em que tantas vezes te via,
e ainda ouço, no meu canto, o que o teu amor me dizia.
Nuno Júdice
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