A minha concepção de realismo em poesia
não me obriga a falar da realidade quando
escrevo o poema, nem a ter as mãos sujas
do barro e de lama de que a vida é feita. Mas
quando saio de casa e as ruas me aparecem
com a evidência dos seus habitantes,
ou quando leio os títulos dos jornais na
banca da esquina, essa realidade é outra;
não digo que seja mais real do que a do
poema, ou que a vida me obrigue
a tirar da cabeça o sonho a que pertence
a outra realidade do que escrevo. O que
posso concluir, porém, é que existe um
conflito entre o que vejo e o que, desse
olhar, passa para o poema. Posso
designá-lo por fractura, e compará-lo
com as palavras que, tal como a água
que corre nas montanhas, e é limpa
pelo filtro invisível da pedra, se deixam
purificar pela música do poema, quando
nascem no verso, como a água na fonte.
Nuno Júdice
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