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sábado, 28 de janeiro de 2023

José Gomes Ferreira

 

Não, não me deixes apagar o destino 
que ajudaste a acender 
nos nossos corações 
atravessados pelo mesmo rio.

Dá-lhe o sopro do sonho,
a lenha dos dedos,
o pólen dos lábios,
as abelhas devoradas pelo mel.

Dá-lhe as chamas que fazem ninho por dentro dos frutos,
a cal das unhas cândidas que despem os mortos,
os seios suados de treva,
os dentes de rasgar árvores.

Dá-lhe o mundo louco de caveira,
os tambores da fome,
as carícias de seda inquieta,
o frio arrancado dos punhais,
a morte - jeito de mais luz.

Dá-lhe o terror. o com o copo de veneno à cabeceira,
o hálito dos abismados,
os túmulos arranhados, as mãos de vidro na testa,
os lábios que sabem ao suicídio dos anjos.

Dá-lhe tudo, tudo, tudo, tudo...

... a bela fogueira do destino 
onde te lançaste viva 
e eu continuo a arder em labaredas de cinzas.


José Gomes Ferreira



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