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quarta-feira, 9 de julho de 2025

Nuno Júdice

 




Uma carta que atravesse o tempo, se fixe 
no que é essencial, na vida, ou então desleixe 
os pormenores da filosofia para encontrar 
os aspectos acessórios do ser - falo do amor, 
da angústia, de outras emoções -, terá sem dúvida
um destinatário. Mesmo que a sua forma seja a 
do poema, que se limita ao mínimo quando fala 
do mundo ou da pessoa, alguém espera as 
suas palavras, versos, frases, tudo o que, num 
determinado e imprevisível instante, poderá 
preencher esses vazios que interrompem o curso 
da existência. De facto, um poema não precisa 
de selo ou de marco, não é levado por ninguém 
para a caixa do correio, nem traz envelope que se 
tenha de rasgar, para ver o que está lá dentro. Mas 
tem sempre uma voz - tal como a carta, que nos fala em 
vez de alguém, substituindo a sua ausência. E, 
tal como essa voz, obriga-nos a uma resposta, 
que até pode ser em silêncio, mas agora sem a solidão.


Nuno Júdice

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