Escreve!
Não sei o que supor
Do teu silêncio. Escreve!
Quem é amado deve
Ser grato ao menos, flor!
Do teu silêncio. Escreve!
Quem é amado deve
Ser grato ao menos, flor!
Se eu fosse tão feliz
Que te falasse um dia,
De viva voz diria
Mais do que a carta diz.
Que te falasse um dia,
De viva voz diria
Mais do que a carta diz.
Mas olha, tal qual é,
Não rias desse escrito,
Que pouco ou muito é dito
Tudo de boa-fé.
Não rias desse escrito,
Que pouco ou muito é dito
Tudo de boa-fé.
Há nesse teu olhar
A doce luz da Lua,
Mas luz que se insinua
A ponto de abrasar...
A doce luz da Lua,
Mas luz que se insinua
A ponto de abrasar...
Pareça nele, sim,
Que há só doçura, embora,
Há fogo que devora...
Que me devora a mim!
Que há só doçura, embora,
Há fogo que devora...
Que me devora a mim!
Que mata, mas que dá
Uma suave morte;
Mata da mesma sorte
Que uma árvore que há;
Uma suave morte;
Mata da mesma sorte
Que uma árvore que há;
Que ao pé se lhe ficou
Acaso alguém dormindo
Adormeceu sorrindo...
Porém não acordou!
Acaso alguém dormindo
Adormeceu sorrindo...
Porém não acordou!
Esse teu seio então...
Que encantadora curva!
Como de o ver se turva
A vista e a razão!
Que encantadora curva!
Como de o ver se turva
A vista e a razão!
Como até mesmo o ar
Suspende a gente logo,
Pregando olhos de fogo
Em tão formoso par!
Suspende a gente logo,
Pregando olhos de fogo
Em tão formoso par!
Ó seio encantador,
Delicioso seio!
Que júbilo, que enleio,
Libar-lhe o néctar, flor!
Delicioso seio!
Que júbilo, que enleio,
Libar-lhe o néctar, flor!
Eu tenho muita vez
Já visto a borboleta
Na casta violeta
Pousar os leves pés;
Já visto a borboleta
Na casta violeta
Pousar os leves pés;
E num enlevo tal,
Numa avidez tamanha,
Que a gente a não apanha
Com dó de fazer mal!
Numa avidez tamanha,
Que a gente a não apanha
Com dó de fazer mal!
Pegada à flor então
No pé curvinho e mole,
As asas nem as bole
Toda sofreguidão!
No pé curvinho e mole,
As asas nem as bole
Toda sofreguidão!
Pousou... adormeceu!
Só vê, só ouve e sente
O cálix rescendente
Daquele mel do céu!
Só vê, só ouve e sente
O cálix rescendente
Daquele mel do céu!
Pois vê com que prazer
E com que ardente sede
Te havia... que não hei-de!...
Também beijar, sorver!
E com que ardente sede
Te havia... que não hei-de!...
Também beijar, sorver!
Mas eu só peço dó,
Só peço piedade!
Mata-me a saudade
Com duas Unhas só!
Só peço piedade!
Mata-me a saudade
Com duas Unhas só!
Eu, a não ser em ti,
Achar alívios onde?
Escreve-me! responde
A carta que escrevi!
Achar alívios onde?
Escreve-me! responde
A carta que escrevi!
Cansado de esperar
Às vezes quando saio,
Pensas que me distraio?
Pois volto com pesar!
Às vezes quando saio,
Pensas que me distraio?
Pois volto com pesar!
Concentra-se-me em ti
A alma de tal modo,
Que esse bulício todo
Nem o ouvi, nem vi!
A alma de tal modo,
Que esse bulício todo
Nem o ouvi, nem vi!
Ninguém te substitui
Porque só tu és bela!
Que estrela a minha estrela,
E que infeliz que eu fui!
Porque só tu és bela!
Que estrela a minha estrela,
E que infeliz que eu fui!
Mas devo-te supor
Sempre indulgente e boa:
Escreve-me e perdoa
Meu violento amor!
Sempre indulgente e boa:
Escreve-me e perdoa
Meu violento amor!
Respeita uma afeição
Inútil mas sincera!
Tu és mulher, pondera
O que é uma paixão.
Inútil mas sincera!
Tu és mulher, pondera
O que é uma paixão.
Com sangue era eu capaz
De te escrever; portanto,
Tinta não custa tanto,
E não me escreverás?
De te escrever; portanto,
Tinta não custa tanto,
E não me escreverás?
Uma palavra, sim,
Que me não amas... queres?
Enquanto me escreveres,
Tu pensarás em mim!
Que me não amas... queres?
Enquanto me escreveres,
Tu pensarás em mim!
Só essa ideia, crê,
Encerra mais doçura
Que as provas de ternura
Que outra qualquer me dê!
Encerra mais doçura
Que as provas de ternura
Que outra qualquer me dê!
João de Deus, in 'Campo de Flores'
1 comentário:
Escreve-me e perdoa
Meu violento amor!
Respeita uma afeição
Inútil mas sincera!
beijinho.
Enviar um comentário